Rebecca Brito – acadêmica do 5° semestre de Relações Internacionais da Unama

Traçando um paralelo histórico, sabe-que que o surgimento do termo nacionalismo segundo o historiador Eric Hobesbawm (2004) se origina durante a Revolução Francesa de 1789, definido a priori por critérios etnolinguísticos e a posteriori por questões raciais, desenvolvendo-se a partir da história europeia como uma invenção social que corrobora para a fabricação de um sentimento nacional em comum que permeia a ideia de nação. Nesse sentindo, pode-se compreender o nacionalismo como uma manifestação cultural construída politicamente, fundamentada com base na etnia, território, língua, religião, forma de governo, identidades oprimidas e, sobretudo, pelo interesse de determinado grupo que por alguma razão se sente subjugado (CHAGAS, 2018, p.261)

Eventualmente, observa-se que o nacionalismo durante a Revolução francesa que serviu para “instigar o espirito insurrecional da população” (GEARY, 2005, p.36) e contribuiu para inúmeros movimentos de independência e conflitos, constitui-se, hoje, nas mãos dos Estados, como uma forma de “considerar a nação a que se pertence, por uma razão ou por outra, melhor do que as demais nações e, portanto, com mais direitos, sendo manifestações extremadas desse sentimento a xenofobia, o racismo e a arrogância imperial.” (GUIMARÃES, 2008, p.145). Sob esse viés, o nacionalismo se estabelece como uma ideologia capaz de despertar potenciais vínculos identitários sociais que se tornam no meio político como ferramenta para homogeneizar povos em unidades políticas e mobiliza-los a partir de interesses.

Dessa forma, o nacionalismo ligado principalmente a governos de extrema-direita provoca, então, no sistema internacional, ameaças ao diálogo e a cooperação entre as nações, enfraquecendo a política internacional e, à medida que a ultradireita cresce na Europa (CNN, 2022), em países como a Itália, Suécia, Hungria e entre outros, mais políticas de caráter isolacionistas e xenofóbicas surgem. Deste modo, ocorre uma maior e mais devida promoção desses aspectos, juntamente com a intensificação do fluxo migratório e com o aumento de barreiras que limitam e dificultam a livre circulação de pessoas, legitimando, portanto, crises migratórias que corroboram para a emergência humanitária.

Nesse contexto, a migração torna-se um fenômeno securitizado pelo viés nacionalista e estatocêntrico, a partir de discursos excludentes que fomentam o preconceito e o temor daqueles que se descolocam, por ser supostamente custoso aos Estados, o que torna o tratamento inferior e indiferente na recepção e acolhimento de imigrantes e refugiados, fortalecendo, assim, uma migração insegura, desordenada e irregular, princípios contrários ao pacto global para migração, tornando árduo o caminho para se percorrer rumo a estabilidade.

De acordo com o direito cosmopolita descrito na obra “A paz perpetua”, de Immanuel Kant (2008), sendo o indivíduo considerado cidadão do mundo, este tem direito a hospitalidade universal. Logo, subentende-se que a questão das fronteiras deve se limitar a espaços políticos organizacionais atemporais que não devem trazer problemas ao livre deslocamento dos indivíduos. Entretanto, o que se observa no sistema internacional é a invisibilidade daqueles que são forçados a se deslocar, haja vista fronteiras cada vez mais militarizadas.

Linklater, importante contribuinte da teoria crítica das Relações Internacionais ao estudar sobre comunidades políticas para além da ideia de Estado-nação, inspirado no cosmopolitismo kantiano e pelo comunitarismo de Habermas, afirma nesse sentido que “Estados soberanos, […] como comunidades morais limitadas, promovem a exclusão, a injustiça e a insegurança em nome de rígidas fronteiras que separam ‘nós’ de ‘eles’.”  (SARFATI, 2005, p.256). O que se constata como consequência na formulação dos países, de uma ética dos excluídos internacionais, onde se pode destacar migrantes e refugiados.

Sob essa lógica, o aumento do nacionalismo e a crise migratória são questões que devem ser solucionadas com urgência através do universalismo étnico, da prioridade da perspectiva humana de inclusão dos indivíduos como cidadãos do mundo, de uma visão menos estatocêntrica e mais cosmopolita, humana e crítica, que possibilite o deslocamento seguro, ordenado e regular, por meio de uma ética discursiva emancipatória, no qual direitos humanos sejam respeitados independentemente do pertencimento nacional.

Referências:

Chagas, Rodolfo. (2018). O resgate de fronteiras e a emergência de movimentos nacionalistas na Europa. Disponível em: http://dx.doi.org/10.21826/9788563800367-16. Acesso em: 19 de maio de 2023.

GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Nação, nacionalismo, Estado. Estudos avançados, v. 22, p. 145-159, 2008.

HOBSBAWM, Eric John; LAINS, Carlos; DE ALMEIDA, José Soares. A questão do nacionalismo: nações e nacionalismo desde 1780, programa, mito, realidade. 2004.

Geary, Patrick J. .O Mito das Nações. A invenção do nacionalismo

Lisboa, Gradiva, 2008, 204 pp.

SARFATI, Gilberto. Teorias de relações internacionais. Editora Saraiva, 2005.

KANT, Immanuel. À paz perpétua: um projeto filosófico. Coleção Textos Clássicos de Filosofia. Universidade da Beira Interior. Covilhã: Portugal, 2008. Disponível em: <http://www.lusosofia.net/textos/kant_immanuel_paz_perpetua.pdf> Entenda o crescimento da extrema-direita na Europa nos últimos anos. CNN, 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/entenda-o-crescimento-da-extrema-direita-na-europa-nos-ultimos-anos/. Acesso em: 19 de maio de 2023.