Lana Borges – Acadêmica do 5° semestre

Recentemente, temos visto crescer o debate acerca da exploração de petróleo na margem equatorial da costa brasileira. O principal embate se dá entre a Petrobras, junto dos maiores interessados nos ganhos econômicos que a atividade trará, e as comunidades tradicionais, moradores locais e defensores do meio ambiente, que se preocupam com os impactos socioambientais deste grande empreendimento.


A discussão acerca da exploração de petróleo na foz do rio Amazonas não é nova. Na realidade, em 2013, foram negociados 12 blocos na região durante a 11ª Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). O bloco em questão, que está sendo alvo de discussão entre o IBAMA e a Petrobras, é o FZA-M-59 que, a princípio, foi adquirido por um consórcio entre a British Petroleum Energy do Brasil Ltda. (70%) e Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras (30%). Após muitos estudos e tentativas de licenciamento mal sucedidas, a BP Energy resolveu abandonar o empreendimento, deixando-o para a Petrobras (IEPÉ, 2023).


Diante da ameaça que esta exploração representa para a comunidade local, a sociedade civil organizada fez uma carta, assinada por 80 entidades, pedindo ao governo federal que não permita que este processo avance, enquanto não forem feitos melhores estudos e sejam dadas garantias à comunidade afetada. Além disso, eles emitiram um parecer técnico detalhado na carta sobre o processo de licitação da região, e quais as lacunas do projeto da Petrobras. Os principais parâmetros que estão sendo discutidos são o Plano de Emergência Individual (PEI), Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) (IEPÉ, 2023).


É importante ressaltar que a Petrobras e os políticos envolvidos no processo estão pressionando o IBAMA sob a alegação de que a Licença de Operação que está sendo pleiteada nesse momento é apenas para a Avaliação Pré-Operacional (APO), ou seja, perfuração com fins de comprovação de que existe óleo na região. No entanto, o IBAMA afirma que é necessário ser feito um estudo profundo e detalhado dos impactos antes de qualquer perfuração, pois caso a existência de hidrocarbonetos seja comprovada, o licenciamento para a produção é tratado como “fato consumado” (IEPÉ, 2023).


As principais pendências apontadas pelo IBAMA são as falhas e insuficiências na “modelagem de dispersão do óleo, em que seja incorporada a complexidade da morfologia costeira amazônica e da hidrodinâmica local”, assim como a comprovação “da capacidade para gestão dos riscos socioambientais do empreendimento” (IBAMA, RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº 17/2022). Além disso, o órgão aponta a problemática da falta de uma AAAS, que é feita pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e pelo Ministério de Minas e Energia (MME), tendo como função principal avaliar a exploração do petróleo de maneira geral, ressaltando o interesse da coletividade, possuindo caráter regional e visualizando a bacia sedimentar como um todo, para além do bloco ou atividade econômica individualizada (IEPÉ, 2023).


Outro fator importante apontado pelo IBAMA foi a necessidade de audiências de consulta pública, livre, prévia, e de boa fé por parte da Petrobras e dos representantes políticos às comunidades e grupos de interesse que podem ser atingidos por este empreendimento, ressaltando os Povos Indígenas do Oiapoque (AP), Karipuna, Palikur- Arukwayene, Galibi Marworno e Galibi Kali’na, cujas Terras Indígenas (TIs) estão ao lado da base aérea, e que sofrerão com o aumento de 3000% em movimentação do aeroporto, além dos impactos por conta da infraestrutura e serviços necessários para a atividade; a Comunidade Quilombola de Abacatal/Aurá (Ananindeua/PA), localizada próxima à base marítima em Belém, município que receberá os resíduos da atividade, e que foi escolhida para ser ponto de apoio e base dos navios de apoio às plataformas; e a Comunidade de Pirocaba (Abaetetuba/PA), que sofrerá interferência na pesca artesanal (IBAMA, RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº 17/2022).


Com relação às audiências, as mesmas não têm cumprido o objetivo de informar ou escutar a população. A jornalista Rayane Penha foi até Oiapoque para realizar pesquisas e entender a real impressão da população sobre o empreendimento. Ela constatou que foram realizadas duas audiências públicas no estado do Amapá: uma no dia 19 de maio pela assembleia legislativa do Amapá (no Oiapoque) e outra no dia 26 de maio, em Macapá, pela Câmara de Vereadores do município. Os pescadores afirmaram que as assembléias serviram apenas como forma de propagandear políticos e o projeto da Petrobras, mas que a população interessada não teve direito a fala. Em Macapá, os ativistas e representantes da sociedade civil organizada não foram convidados para a audiência, o que foi confirmado pelo autor do evento, que afirma que não houve tempo para tanto. Além disso, a população reclama que as audiências não são divulgadas, e são feitas em horário inviável para ampla participação dos trabalhadores locais (PENHA, 2023).


Em Belém, capital do estado do Pará, cidade que será base de apoio para a exploração do petróleo da foz do rio Amazonas (caso ela venha a se concretizar), a situação das consultas públicas não foi diferente. Os movimentos sociais não foram convidados, e a divulgação também não foi ampla. Mesmo assim, representantes de alguns movimentos, como o Movimento dos Atingidos por Barragem, Associação índigena Wyka Kwara, Observatório do Marajó e vários outros se uniram para fazer uma carta manifestando seu posicionamento contrário à exploração. Porém, assim como nas outras audiências, a população não teve direito de fala.


Segundo Marx e Engels, em sua obra O manifesto do Partido Comunista, a burguesia, no processo de formação do estado capitalista, conseguiu estabelecer a “soberania política exclusiva no Estado representativo moderno” (MARX; ENGELS, 2010, p. 42-43). Neste sentido, o Estado é um gerenciador dos interesses da burguesia, que garante a manutenção da ordem vigente e das condições de acumulação de riqueza. No entanto, nesse processo também ocorre a formação do proletariado enquanto classe que, se organizando para a luta política que garanta melhores condições de vida, trabalho e sobrevivência, representa uma ameaça à dominação e aos interesses da classe dominante.
Neste sentido, percebe-se o caráter da histórica luta de classes na questão da exploração de petróleo na margem equatorial da costa brasileira. Apesar de representar grandes riscos socioambientais, e já está impactando comunidades de pescadores, indígenas e ribeirinhos, a classe burguesa insiste e pressiona o IBAMA e o atual governo brasileiro através de certos agentes políticos, como senadores e deputados, utilizando a retórica do desenvolvimento, geração de riqueza e protagonismo amazônico, que seriam bons para a sociedade de maneira geral, apelando inclusive para a situação de pobreza, subdesenvolvimento e atraso da região norte. O que eles não mencionam, no entanto, é que apesar de diversos projetos de exploração já terem sido implementados na região norte com a mesma justificativa de desenvolvimento, a exemplo das grandes explorações de minério e a construção de barragens hidrelétricas, a população nunca foi positivamente impactada, e os lucros obtidos com essas atividades nunca foram utilizados para desenvolver a região ou compensar as perdas dessas pessoas de forma justa. Na realidade, o cenário predominante é que anos depois, as populações atingidas por esses grandes empreendimentos continuam marginalizadas, tentando reconstruir suas vidas.


Para concluir, podemos perceber que a Petrobras e os grandes grupos financeiros interessados na produção de petróleo na foz do Amazonas não têm compromisso com o meio ambiente, e nem podem garantir que os lucros e ganhos dessa atividade econômica serão realmente do interesse geral, uma vez que, historicamente, a burguesia fica com o bônus, e a população local fica apenas com o ônus.

REFERÊNCIAS

Instituto de Pesquisa e Formação Indígena. IEPÉ ASSINA CARTA PEDINDO QUE O GOVERNO FREIE EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO NA FOZ DO AMAZONAS.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº 17/2022. Confira em: https://www.mpf.mp.br/pa/sala-de-imprensa/documentos/2022/recomendacao-conjuntampf-ap-pa-ibama-petrobras-suspensao-perfuracao-foz-amazonas.pdf

Penha, Rayane. Exploração de petróleo assombra pescadores da foz do Amazonas. A Pública. 2023.

Bugiato, Caio. Marx e Engels: política internacional e luta de classes. Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 13, n. 3, 2018, p. 193-212.

Manifesto em defesa da vida: dizemos não à exploração de Petróleo na Bacia da Foz do RioAmazonas! https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSfqsokDL5LVjoP7vA0QJM6vESjbMeX4FL7rwxpKAqRV32u73w/viewform

MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Boitempo, 2010.