
Maria Bethânia Gomes Galvão (acadêmica de Relações Internacionais da UNAMA)
As grifes do setor de luxo aparentam, superficialmente, participarem de um setor “diverso”, quando, na verdade, são controladas pela mesma holding que detém toda a sua cadeia de produção e suas finanças, incorporando-as em um mesmo grupo, dessa maneira assumem a forma de oligopólio, sendo o grupo LVMH e Kering as maiores holdings do setor de luxo global. Esse fenômeno é uma característica do capitalismo em sua fase superior de desenvolvimento que considera que a livre concorrência gera a concentração da produção, a qual, atingindo um certo grau de desenvolvimento, conduz, por ela própria, permita-se a expressão, diretamente ao monopólio (LENIN, 1987).
Nesse sentido, de acordo com dados da empresa Deloitte, do ano de 2019, a LMVH ocupou a primeira posição entre os dez maiores conglomerados do setor de luxo do mundo com a Kering ocupando o 4º lugar. No ano de 2017 essas empresas obtiveram na receita fiscal cerca de US$ 27,9 bilhões e US$ 12,1 bilhões em vendas, respectivamente. Sobre esse mesmo estudo, o valor que representa o setor de luxo na economia mundial é de 42,8%, quase metade do valor produzido na economia mundial.
Durante a pandemia, a economia mundial passou por uma crise, demonstrando a fragilidade das empresas de manterem sua margem de lucro, pressionando-as a tomarem ações de corte de gastos – fechamento de lojas, restrições de viagens, alterações na procura por parte dos consumidores, perturbações na cadeia de abastecimento, entre outros (OSORIO, 2021), os quais impactaram a vida de milhões de pessoas durante o período. Longe de enfraquecerem, os grupos de luxo franceses fortaleceram-se com a pandemia (OSORIO, 2021), tendo a LVMH e a Kering mantido suas posições no top 10 maiores empresas de luxo por venda – FY 2020, dados do Deloitte de 2020.
Isso revela um comportamento contrário às tendências das empresas da economia real. É nesse contexto que a globalização financeira ganha força, a qual consiste na instauração de um mercado unificado do dinheiro em âmbito planetário (PLIHON, 1995, p.62), estimulado pela interconexão das praças financeiras pelas redes de comunicações.
Sobre esse fenômeno, enquanto diversos setores da indústria da moda escancaravam suas fragilidades, o setor de luxo diversificava os seus financiamentos para garantir não somente o lucro, mas também a segmentação do seu mercado voltado para o acesso restrito a uma elite econômica. Nessa perspectiva, o conceito de “financeirizar” diz respeito à inserção de uma instituição no mercado financeiro, nesse caso, as corporações.
O campo das Relações Internacionais analisa a complexidade da dinâmica do sistema internacional em todas as suas instâncias: política, econômica e cultural. Em vista disso, faz-se necessário realizar críticas ao modo que o sistema internacional opera, partindo do estudo do meio em que é estruturado. Para isso, a teoria crítica das Relações Internacionais é capaz de oferecer a linha de raciocínio epistemológico para melhor compreensão do debate em questão. Nesse entendimento, a Teoria Crítica das RI possui como objeto de estudo a análise da ordem internacional, considerando fatores que não eram contemplados previamente pelas teorias ‘mainstream’, são esses fatores a influência social, cultural e ideológica para manutenção da ordem internacional.
Por outro lado, a teoria crítica pode ser um guia para a ação estratégica para trazer uma ordem alternativa (COX, 2021, p. 16), tais estratégias envolvem a investigação das instituições e relações sociais e políticas como dados a serem questionados, sendo interessante para a teoria a exploração do potencial de mudança estrutural da ordem vigente.
Desse modo, o tema debatido no trabalho acerca das condições pelas quais a indústria da moda do ramo do luxo permaneceu lucrando em um período de crise econômica e humanitária leva ao questionamento das instituições que contribuíram para esse objetivo, são esses o Estado e as instituições financeiras que operam no mercado financeiro com o intuito de financiar as corporações.
REFERÊNCIAS:
COX, R.W. Forças sociais, Estados e ordens mundiais: além da teoria das Relações Internacionais. Revista OIKOS: Volume 20, n. 2, pgs 10-37, Rio de Janeiro, 2021. Disponível em: < https://revistas.ufrj.br/index.php/oikos/article/view/52053/28342 > Acesso em: 07 de julho de 2023.
DELOITTE. Global Powers of Luxury Goods 2019. Disponível em: < https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/ar/Documents/Consumer_and_Industrial_Products/Global-Powers-of-Luxury-Goods-abril-2019.pdf > Acesso em: 07 de julho de 2023.
LENIN, Vladimir. Imperialismo, fase superior do capitalismo. Global editora: 4º edição, São Paulo, 1987.
MURET, Dominique. Luxo e moda: finanças, um trunfo fundamental em tempos de pandemia. Fashion Network: 16 de novembro de 2020. Disponível em: < https://br.fashionnetwork.com/news/Luxo-e-moda-financas-um-trunfo-fundamental-em-tempo-de-pandemia,1259853.html > Acesso em: 07 de julho de 2023.
PLIHON, Dominique. A ascensão das finanças especulativas. Economia e Sociedade, Campinas, (5):61-78, dez.1995.
OSORIO, Helena. França lidera ranking mundial do luxo no último relatório da Deloitte. Fashion Network: 6 de dezembro de 2021. Disponível em: < https://br.fashionnetwork.com/news/Franca-lidera-ranking-mundial-do-luxo-no-ultimo-relatorio-da-deloitte,1358923.html > Acesso em: 07 de julho de 2023.
