
Giovana Reis – acadêmico do 8° semestre de Relações Internacionais da Unama
Guerra Híbrida é o termo utilizado para descrever a quarta geração de guerras, e de acordo com a evolução da sociedade os seus meios de conflito seguiram a mesma linha evolutiva. As guerras híbridas são descritas por HOFFMAN (2007) como estratégias multimodais, ações convencionais e irregulares aplicadas por estados e agentes externos não estatais com intuito de desmoralizar, deslegitimar Estados e estimular o colapso de governos, como por exemplo sanções econômicas, movimentos de insurgência, ataques cibernéticos, divulgação de Fake News entre outras.
Desse modo, os recentes acontecimentos entre Rússia e Ucrânia estão evoluindo para o que pode ser categorizado como um estilo de guerra híbrida, pois mesmo que de fatos já exista um conflito convencional instalado no território ucraniano, houve muitos ataques irregulares e troca de ofensivas entre os países, que antecederam a invasão russa. (PAÚL,2022)
Conforme descrito por CONANT (2023), a origem dos desentendimentos entre estes países é longa, uma delas foi a estratégia de Joseph Stalin no território do leste ucraniano em 1974 que culminou em um processo de repovoamento russo após uma onda de fome que dizimou a população, fator que contribuiu para o estreitamento do laço entre os países, e somente em 1991, com fim da URSS, a Ucrânia iniciou seu processo de afastamento da Rússia e aproximação com o ocidente, fator este que sempre preocupou e desagradou a Rússia. A dualidade presente na Ucrânia pós independência que aparentava ser demais extremas em tamanho desarranjo, estava bem evidente, e sua primeira aproximação significativa com o Ocidente foi ao entrar em contato com a OTAN, renunciando a seu arsenal nuclear em troca de um acordo entre Estados Unidos, Rússia e UE para proteger e manter sua soberania sobre seu território. Em seguida a este primeiro passo houve chegada da Revolução Laranja uma dentre a series de revoluções coloridas que tinham por intuito desenvolver governos pró-ocidentais.
De acordo com Bijus & Montes (2015), com o intuito de virar a direção do governo, os grupos alegaram fraudes eleitorais e corrupção nas eleições que dava vitória ao líder político Yanukovich, e após uma série de manifestações o país passou por uma segunda eleição que deu vitória a Yushchenko. Apoiadores do partido de Yushchenko receberam apoio financeiro dos EUA e mais tarde seus membros foram proibidos de entrar novamente na Ucrânia. Esse período de revolução marca um estado de desejo de aproximação por parte da Ucrânia com países do ocidente, porém ainda existe uma forte ligação econômica e política com a Rússia. No início de 2008 a Ucrânia parte para estabelecer maiores laços com UE. 10 anos após a revolução laranja a Rússia voltou seu olhar mais incisivo para o controle da região e anexou o território da Crimeia em meio a uma revolta separatista na região de Donbass, resultando na separação das repúblicas de Donetsk e Lugansk, duas regiões de extrema importância, sendo uma um grande território de favorável atividade agrícola e outro um grande polo industrial químico e siderúrgico, e por estar estrategicamente posicionado para o Mar Negro e Mediterrâneo, ambas regiões receberam apoio e reconhecimento russo. Separatista tomam contas destas regiões, levando a conflitos que resultaram em perdas significativas de pessoas naquela região.
Antecedendo ainda a invasão, segundo Hofmann (2022) houveram ataques cibernéticos ao ministério da defesa por parte da Rússia, e dois bancos de extrema importância foram alvos sendo eles: PrivatBank e Oschadbank, tudo em conjunto com o relato de uma intensa posição ofensiva nos confrontos alocados ao leste da Ucrânia entre os rebeldes pró-russos treinados pela Rússia e também apoiados por soldados de Lugansk e Donetsk e o Exército ucraniano, tudo isso sobre a sombra do possível reconhecimento das já autoproclamadas repúblicas populares.
Em fevereiro a Rússia invadiu o território Ucraniano e declarou o início de uma “Operação Militar Especial” conforme descrito por Putin. Logo após a situação a Ucrânia solicitou a expulsão da Rússia do sistema financeiro Swift, algo consolidado após a deliberação de países como EUA, França, Alemanha, Itália entre outros, e mesmo com a exclusão aprovada, alguns países hesitaram na decisão devido ao controle russo na distribuição de gás natural, fator de grande dependência de países europeus (BBC, 2022).
Enquanto isso a entrada da Ucrânia na OTAN, outro fator de extrema importância no que tange o desenvolvimento do conflito, significa um risco iminente de uma guerra de maior proporção. A detenção de poder russo sob os recursos essenciais para toda União Europeia e sua paridade nuclear com EUA são fatores que ainda contribuem para o recuo de investidas mais duras contra Rússia e mantem a Ucrânia mais longe da adesão ao bloco, enquanto Zelensky cobra um maior posicionamento da OTAN e da União Europeia, eles se vêm cautelosos quanto aos próximos passos a serem dados (COLLINSON, 2023). Para Mearsheimer (2001) “Grandes potências não trabalham juntas para promover a ordem mundial por si só. Em vez disso, cada um procura maximizar sua própria parcela de poder mundial, o que provavelmente entrará em conflito com o objetivo de criar e sustentar ordens internacionais estáveis. Isso não quer dizer que as grandes potências nunca visam evitar guerras e manter a paz”. Sob esta perspectiva o papel da OTAN e dos EUA com relação a situação Ucraniana se assemelharia ao ideal da busca de maximizar sua influência, mesmo diante da consequência dos riscos que poderia acarretar, quanto a Rússia e Ucrânia vale a mesma reflexão, ambos os atores envolvidos estão na sua busca particular de cumular sua própria parcela de poder.
REFERÊNCIAS:
BIJOS, Leila e MONTE, Fernando. Rússia e ucrânia: uma análise dos princípios da segurança, estabilidade e previsibilidade internacionais. Brasília, Revista Direito em Ação da UCB, 2015.
COLLINSON, Stephen. Análise: Por que o apelo da Ucrânia para ingressar na Otan é um dilema profundo? CNN, 2023. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/analise-por-que-o-apelo-da-ucrania-para-ingressar-na-otan-e-um-dilema-profundo/
CONANT, Eve. Rússia e Ucrânia: A Complicada história que conecta (e divide) os dois países. National Geographic, 24 de fev. 2023. Disponível em: https://www.nationalgeographicbrasil.com/historia/2022/02/russia-e-ucrania-acomplicada-historia-que-conecta-e-divide-os-dois-paises/amp
HOFFMAN, Frank. Conflict in the 21 century : The rise of Hybrid Wars. Potomac Institute for Policy Studies. Arlington, Virginia. N 901, P. 5 – 67. Dezembro de 2007. Disponível em: https://potomacinstitute.org/images/stories/publications/potomac_hybridwar_0108.pdf
HOFMANN, Frank. A Guerra Hibrida Russa contra a Ucrânia. DW , 17 de Fev. de 2022. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/a-guerra-h%C3%ADbridarussa-contra-a-ucr%C3%A2nia/a-60819110
MEARSHEIMER, John. The tragedy of great power politics. New York, 2001. PAÚL, Fernanda. Rússia x Ucrânia: entenda ‘guerra híbrida’ que ucranianos acusam Putin de promover. CNN, 08 de Fev. de 2022. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60304746
