Railson Silva – acadêmico do 6° semestre de Relações Internacionais da Unama

No último milênio tornou-se perceptível a produção de uma geração de pensadores engajados em repensar as concepções mainstream sobre a origem, a organização e a lógica do sistema internacional moderno. Assim, o lugar que o pós-colonialismo ocupa nos estudos internacionais vem crescendo com bastante vigor trazendo uma importante e cada vez mais volumosa produção acadêmica em RI que vem se transformando cada vez mais. Sanjay (2009), afirma que o pós-colonialismo se constitui como uma estratégia para desafiar o eurocentrismo, sendo assim, segundo o autor, mais receptivo à ideia de que o conhecimento é capaz de possibilitar novas condições e não apenas “recontar” a história.

Em primeira instância, o historiador indiano foca suas análises nos estudos subalternos, nos quais ele desenvolve um projeto historiográfico sobre a história indiana que tem sido de extrema importância na teorização pos-colonial. Ademais, Sanjay busca questionar o privilégio epistemológico atribuído ao ocidente e as relações de poder que envolvem essa centralidade do saber. Dessa forma, o autor enaltece que o pós-colonialismo não buscará apenas corrigir as bases das ciências sociais, mas na criação de “verdades” que possibilitem a justiça, a paz e o pluralismo político.

Em sua obra “História e Pós-colonialismo(2022), ao iniciar o seu texto, ele apresenta o papel do Ocidente Europeu na composição das historiografias. E aponta, ao longo da obra, a relativização   da epistemologia   ocidental-iluminista   advinda   do   pensamento eurocêntrico no que diz respeito à história e a exclusão de sujeitos não-ocidentais na produção da razão historiográfica (MACEDO, 2020). Dessa forma, Sanjay (2013) aborda a questão que a visão imperialista inviabiliza outras culturas, sendo consideras incapazes de representar sua própria história por serem supostamente “atrasadas”.

Nessa perspectiva, o historiador desafia a centralidade atribuída à Europa como origem da ordem do SI, questionando que a instrumentalização científico-prático da história como uma razão ocidental gerou um tipo  de  aplicação universalista não existente em civilizações e culturas ditas não-ocidentais, criando uma demarcação temporal-universal antes não questionada.

Nesse viés, buscar resgatar a cultura se torna crucial para o processo de libertação colonial, visto que segundo o autor, a história não pode desconsiderar determinas cosmovisões para a construção do passado, pois dessa forma os “problemas da política do conhecimento permanecem, precisamente porque as categorias centrais das ciências sociais são produto da história europeia” (SETH, 2009, p. 336). Assim, a inclusão de uma pluralidade de tradições abre portas para sair de uma certa ingenuidade epistemológica, logo:

O passado não  está  para  sempre  disponível  ao  presente  como  uma  entidade emudecida, esperando que o (a) historiador (a) lhe dê uma voz. A escrita da história não é simplesmente um “ofício” que se aplica a um objeto pré-existente, natural; ao contrário, e como qualquer disciplina, a escrita da história concebe e constrói o seu objeto (SETH, 2013, p.180).

Partindo desse pressuposto, o autor fala que a escrita da história possui uma dimensão construtivista. Logo, para um raciocínio histórico potente e de síntese, a pluralidade de visões sobre um  mesmo  fato se ver necessário a fim de construir  novas relações subjetivas, sem que haja, portanto, um privilégio epistêmico a priori.

Em suma, Seth oferece uma visão cultural mais ampla da escrita da história, tendo em vista que a questão de haver apenas uma narrativa universal pode enganar e causar desconforto. Dessa forma, o pensamento pós-colonial de seth é imprescindível para as RI, no que diz respeito ao pensar uma mediação cultural mais diversa, transversal e horizontal que leve em consideração às diferentes formas de conceber o passado. Pois só dessa maneira, segundo Seth, se é possível se libertar de uma razão unívoca e abrir amplas e novas possibilidades de análises e crítica dos dispositivos e modos de dominação no sistema internacional.

Referências:

MACEDO, A. L. N. A história do eurocentrismo na história intelectual. Revista de Teoria da História, Goiânia, v. 23, n. 1, p. 257–281, 2020. DOI: 10.5216/rth.v23i1.61801. Disponível em: <https://revistas.ufg.br/teoria/article/view/61801&gt;.

SETH, Sanjay. (2009): Historical Sociology and Postcolonial Theory: Two Strategies for Challenging Eurocentrism. En: International Political Sociology, 3(3), p. 334-338.

SETH, Sanjay . Sociologia Histórica e Teoria Pós-Colonial: duas estratégias para desafiar o eurocentrismoExpedicoes: Teoria da Historia e Historiografia. pp. 263-270. 2016.

SETH, Sanjay. Razão ou Raciocínio? Clio ou Shiva?. História da historiografia, Ouro Preto, n. 11, p. 173-189, abr. 2013. Disponível em: <https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/554/352&gt;SETH, Sanjay . 2022. História e Pós-colonialismo. Ensaios sobre Conhecimento Ocidental, Eurocentrismo e Ciências Sociais. Lisboa: Imprensa de História Contemporânea. ISBN 9789898956385 [Livro]. Disponível em: <https://imprensa.ihc.fcsh.unl.pt/seths2022/>