Thais Vitória Borges – acadêmica do 6º semestre de Relações Internacionais da Unama

O Pós-Modernismo nas Relações Internacionais, como afirma Sarfati, é parte de um movimento mais abrangente das Ciências Sociais. O objeto de estudo dessa linha de pensamento é a crítica à suposta racionalidade do Modernismo, esta que deriva do pensamento iluminista. Tendo isso em vista, o intuito do Pós-Modernismo é desmascarar as narrativas que estão por trás dos discursos teóricos, as chamadas metanarrativas dos discursos sociais, ou seja, investigando assim a narrativa que constrói as narrativas sociais (Sarfati, 2005).

Um dos objetivos do Pós-Modernismo, dentro do campo das Relações Internacionais, é a busca por desconstruir as teorias de RI, apontando as problemáticas da imaginada racionalidade e objetividade da categorização na disciplina. Dentro desse segmento, Jacques Derrida se volta à desconstrução do pensamento filosófico ocidental, investigando a diferença entre a estrutura do texto e a essência metafísica – isto é, a essência da existência do ser – no pensamento ocidental. Através da desconstrução desses discursos, o autor percebeu que toda a análise que seria científica é resultado de estudos compostos por visões subjetivas sobre o mundo.

Nascido em 1930, em El-Biar na Argélia (até então parte da França), Derrida fundou a linha teórico-crítica da “Desconstrução”, um trabalho incessante de investigação que, coloca sob suspeita os discursos das Ciências Humanas, Literatura, História, Fenomenologia e Psicanálise, questionando até mesmo o conceito clássico de ciência. Essa desconstrução causou abalo na hegemonia dos discursos ao levantar questionamentos, deslocamentos e re-alocações de conceitos que eram considerados canônicos do pensamento metafísico ocidental – estes que se apoiavam comumente nas relações binárias, estabelecendo assim uma hierarquia ou supremacia de um termo sobre o outro, como por exemplo: dentro/fora, corpo/mente, presença/ausência, homem/mulher (Junior, 2010).

Derrida afirma que conceitos opostos nunca são simplesmente neutros mas são inevitavelmente hierárquicos, um dos dois termos dessa oposição está privilegiado sobre o outro, e este termo privilegiado supostamente conota a uma presença, plenitude, propriedade, pureza ou identidade que falta ao outro (Devetak, 2022). Assim sendo, desconstruindo esses discursos, não se pode afirmar que exista uma ciência empirista e racional alheia aos valores que a construíram, ou seja, não há uma realidade objetiva ou mesmo uma teoria que possa ser encarada como tal.

Vale destacar que a “desconstrução” tratada por Derrida não pode ser encarada como sinônimo de destruição, consiste na verdade em desfazer, sem nunca destruir, um sistema de pensamento hegemônico dominante (Derrida & Roudinesco, 2004, p.9 apud Junior, 2010, p.12). A partir dessa desconstrução, o objetivo é apontar que esta ordem, até então encarada como natural, não é verdadeira, mas sim uma construção produzida por discursos que se apoiam nela (Culler, 1999, p.122 apud Junior, 2010, p.11).

No que remete ao trabalho de desconstrução aplicado às Relações Internacionais, seu principal foco é a crítica ao Realismo/Neo-Realismo e demais teorias Estado-cêntricas. Desse modo, um dos primeiros trabalhos consiste na problematização do conceito de Estado, pois, dentro dessas linhas de pensamento, a figura do Estado é tida como unidade natural, como consequência, aceitar esta premissa como verdadeira significa selar um compromisso metafísico pré-científico – de que o Estado não é um objeto de análise passível de falsificação. 

Richard K. Ashley, teórico pós-modernista das RI, aponta que os Estados não são unidades pré-científicas ou pré-políticas, não existindo razão natural alguma para a existência desses, com base nisso, defende que a construção da geografia política mundial é produto de relações de poder, as fronteiras são intencionalmente construídas para diferenciar o interno do externo, a ordem hierárquica do caos da anarquia, o Eu do Outro. Em The poverty of neorealism (1984) afirma que o Neo-Realismo trata uma ordem imposta ao sistema internacional como uma ordem natural, o que limita, mais do que expande os discursos políticos e subordina práticas segundo interesses de poder. 

Concluindo, a desconstrução pós-modernista nas RI questiona qualquer projeto que se afirme como científico, dentro da corrente, não existe a possibilidade de construir uma ciência das RI, do mesmo modo, não há as relações internacionais como um fenômeno passível de observação objetiva. Sarfati afirma que as teorias devem explicar uma determinada realidade pela formulação de hipóteses testáveis, assim, estas não possuem a função de interpretar uma realidade, mas alterá-la ou mesmo construir uma realidade que não existe de fato. Assim o Pós-Modernismo se afirma como um projeto mais voltado à reflexão, desconstrução, investigação e questionamento da racionalidade desses discursos. 

Referências:

ASHLEY, Richard K. The poverty of neorealism. International organization, v. 38, n. 2, p. 225-286, 1984. 

DEVETAK, Richard; TRUE, Jacqui (Ed.). Theories of international relations. Bloomsbury Academic, 2022. 

JUNIOR, Neurivaldo Campos Pedroso. Jacques Derrida e a desconstrução: uma introdução. Encontros de Vista, v. 5, n. 1, p. 48-59, 2010.

SARFATI, Gilberto. Teorias de Relações Internacionais. Saraiva, 2005.