Cristine Oliveira, acadêmica do 4° semestre de Relações Internacionais

Ficha técnica

Ano: 2019 

Autor (a): Itamar Vieira Junior 

Gênero: Romance 

País de origem: Brasil

Vencedor do prêmio Jabuti de 2020, na categoria Romance Literário, “Torto arado”, inspirado nos romances brasileiros das décadas de 30 e 40, acompanha a história de duas irmãs, Bibiana e Belonísia, nascidas no interior da Bahia. O livro traz um olhar cuidadoso ao campo e às relações de servidão, que permanecem, mesmo após o fim da escravidão.

A narrativa inicia com um evento determinante na vida das irmãs, que leva a mutilação da língua de Belonísia. O segredo que Donana guardava embaixo da cama, sempre fascinou suas netas, certo dia, as irmãs se deparam com o que sua avó tanto guardava, uma faca, reluzente e afiada, que em um acidente, silencia Belonísia. A partir desse acontecimento, as irmãs desenvolvem um poderoso laço, e Bibiana passa a ser a voz de sua irmã.

As protagonistas são filhas de Salustina, parteira da comunidade, e Zeca Chapéu Grande, uma espécie de líder espiritual e curandeiro. Bibiana e Belonísia crescem em Águas Negras, um povoado fictício localizado na Chapada Diamantina, onde os moradores trabalham para o senhor, em troca de um pequeno pedaço de terra. Dessa maneira, tudo de qualidade que é produzido vai para o dono da fazenda e o que resta, é somente o suficiente para a subsistência dos trabalhadores.

Ao longo do romance, já adultas, a vida das irmãs toma caminhos distintos, Bibiana, inconformada com a condição de vida degradante em Águas Negras, sai da fazenda para seguir seu sonho de ser professora, e com seu primo Severo, luta para o fim da exploração da força de trabalho, que cércea a liberdade e direitos da comunidade em que cresceu. No entanto, Belonísia permanece na fazenda, mas assim como sua irmã, tem consciência do ambiente opressor em que vive, e em diversos momentos, reflete sobre o papel da mulher na sociedade patriarcal.

Itamar Vieira Junior, traz em sua obra o retrato de um Brasil que tem suas raízes firmadas no regime da servidão e que não deixou completamente o seu status colonial. Dessa maneira, percebe-se que as temáticas abordadas no livro, dialogam com a teoria Pós-colonial das Relações Internacionais, a qual busca entender como o colonialismo moldou as relações de poder no sistema internacional. Segundo Quijano (2000, apud Fonseca, 2021, p. 57) as elites dominantes da América Latina, internalizaram a mentalidade europeia, originando Estados pós-coloniais que deram continuidade às estruturas de poder baseadas na organização colonial.

Sendo assim, como demonstrado em Torto Arado, a continuidade dessas relações coloniais traz consequências profundas para a sociedade, afetando as relações de gênero, raça e classe. Logo, conclui-se que a obra tem um importante papel de reflexão sobre as relações de poder, desigualdades e valorização da luta contra os mecanismos de apagamento impostos pelo colonialismo.

Referências: 

FONSECA, Fernanda Cardoso. Nossa Améfrica Ladina: O pensamento (decolonial) de Lélia Gonzalez. 2021.