
Thais Vitória Borges – acadêmica do 6º semestre de Relações Internacionais da Unama
Os estudos feministas tiveram um espaço tardio na disciplina de Relações Internacionais, fazendo parte do chamado “terceiro debate” em RI — ocorrido na década de 1970 e definido como inter-paradigmático. Tais estudos tiveram o mérito de acrescentar a questão da identidade nas discussões de RI. O fator que tornou urgente trazer para a mesa as pautas feministas foi o reconhecimento por parte da comunidade internacional, da utilização da violência sexual contra as mulheres como objetivos estratégicos em conflitos armados que eclodiram durante o século XX, ou seja, a violência sexual como “arma de guerra”. Com isto, não se podia mais encarar tal cenário a partir do olhar “neutro” e objetivo que as RI até então alegava possuir.
Este argumento de neutralidade se ancorava nas contribuições acadêmicas dos Estudos de Segurança Internacional (ESI) que, tratava a segurança de maneira abrangente — para todos, sem distinção de sexo, gênero, faixa etária, etnia, cor ou nacionalidade; mas é necessário se indagar de quem até aquele momento travava e norteava as pautas de segurança na academia e política, Nogueira e Messari (2005) destacam que eram os homens, e eram os homens que estavam defendendo a sobrevivência de todos.
Nesse sentido, Carol Cohn acrescenta pontos importantes no debate acerca de gênero e segurança, sendo estes seus principais interesses de pesquisa, ademais, também aborda os discursos de gênero das elites de segurança nacional dos EUA e a necessidade de integrar a perspectiva de gênero em instituições de segurança internacional. Também, é Professora na Universidade de Massachusetts, e fundadora do Consortium on Gender, Security and Human Rights.
Dentre suas obras, vale o destaque de Sex and Death in the Rational World of Defense Intellectuals (1987), no qual o objetivo da autora foi discutir a natureza do pensamento da estratégia nuclear, sobretudo estadunidense, com ênfase na linguagem e imagens utilizadas nos discursos dos profissionais de defesa e foco na linguagem sexuada. Com base nisso, a autora expõe que as discussões acerca de estratégia, armas nucleares e guerras são tratadas por tais profissionais sem nenhum senso de horror, urgência ou moral, e examina assim, a linguagem utilizada dentro desses espaços, que nos quais ela afirma serem elaborações abstratas e eufemistas que encobrem o significado das violências por trás dessas palavras (Cohn, 1987).
No que tange a linguagem sexuada, Cohn constata que a lógica de estratégia nuclear, está permeada por termos que visam endossar a narrativa que relaciona a questão armamentista com a validação da masculinidade de um homem, para isso tal discurso se ancora na linguagem sexuada utilizada nessa esfera de segurança. Como por exemplo a questão da “virgindade” e como ela se faz presente em discussões nucleares, sendo usada como metáfora a iniciação de um país no mundo nuclear, o que envolveria um defloramento, a perda de uma inocência deste, o conhecimento do pecado (Cohn, 1987).
Vale o destaque também de Women and Wars (2012), no qual Conh, junto de outras teóricas, aborda a relação entre as mulheres e as guerras, os impactos das guerras sobre as mulheres, as formas como as mulheres participam em conflitos, e as formas de atuação das mulheres na construção da paz, nesta obra, a autora afirma que os conflitos são generificados, e que é impossível entendê-los sem compreender também a questão do gênero (Conh, 2012).
Além disso, Carol Cohn desenvolve importantes pesquisas no que concerne à perspectiva do feminismo anti-guerra, dentro do qual, há uma oposição a práticas de conflitos e busca por substituí-los por práticas não violentas e de reconciliação. Tal oposição advém da percepção que as práticas de conflitos vão para além da morte e destruição dentro de combates armados; na verdade é um ato que cria um “sistema de guerra” que envolve o armamento, treinamento, organização e estruturação de estratégias para possíveis hostilidades, criando assim, por conseguinte, uma cultura em que a guerra é moralmente legítima (Conh; Ruddick, 2004).
Em suma, os debates de gênero e segurança estão em constante evolução, e relacionada ao campo das Relações Internacionais e Estudos de Segurança Internacional tem muito a ser acrescentado, nessa perspectiva, as contribuições da autora, como afirmado por Cordell (2014), atestou um ponto muito necessário para tais discussões: de que as mulheres importam em conflitos armados.
Referências:
A. CORDELL, Kristen. Book Reviews, Women and wars: Contested histories, uncertain futures. PRISM 4, no, 4. Institute for National Strategic Security, National Defense University, 2014
COHN, Carol (Ed.). Women and wars: Contested histories, uncertain futures. John Wiley & Sons, 2012.
COHN, Carol. Sex and death in the rational world of defense intellectuals. Signs: Journal of women in culture and society, v. 12, n. 4, p. 687-718, 1987.
COHN, Carol. Sex and death in the rational world of defense intellectuals. Signs: Journal of women in culture and society, v. 12, n. 4, p. 687-718, 1987.
COHN, Carol; RUDDICK, Sara. A feminist ethical perspective on weapons of mass destruction. Ethics and Weapons of Mass Destruction, p. 405-35, 2004.
COHN, Carol; RUDDICK, Sara. A feminist ethical perspective on weapons of mass destruction. Ethics and Weapons of Mass Destruction, p. 405-35, 2004.
MESSARI, Nizar; NOGUEIRA, João Pontes. Teoria das Relações Internacionais: correntes e debates. Rio de Janeiro: Campus Elsevier, 2005.
MONTE, Izadora Xavier do. O debate e os debates: abordagens feministas para as relações internacionais. Revista Estudos Feministas, v. 21, p. 59-80, 2013.
