
Isabelle Macêdo, Tayse Rocha e Yago Cruz – acadêmicos do 4° semestre de Relações Internacionais da Unama
A história da Síria é marcada por conflitos devido à sua localização estratégica na zona de transição mercantil e de trocas comerciais, o que gerou disputas pelo domínio do território ao longo dos anos. Vários impérios, como o Turco-Otomano, dominaram a região antes do domínio francês após a Primeira Guerra Mundial, domínio que através do acordo Sykes Pycot foi concedido. A independência da Síria começou a ser buscada durante a Segunda Guerra Mundial, com destaque para o nacionalismo árabe (SCARDUELLI, 2022).
No entanto, após períodos de instabilidade política depois da recém independência, Hafez Al-Assad chegou ao poder em 1971 por meio de um golpe militar, instituindo um sistema de governo autoritário. Ele governou até sua morte nos anos 2000 e estabeleceu uma “República Hereditária” com seu filho Bashar Al-Assad como sucessor (SCARDUELLI, 2022).
O governo de Bashar Al-Assad desagradou a muitos cidadãos devido à falta de políticas públicas para as classes menos favorecidas, restrições à liberdade, alto desemprego e outros problemas. No entanto, ele conseguiu permanecer no poder, sendo reeleito em 2007(COSTA, 2018). Em 2010, o início de uma onda de revoltas populares contra líderes ditatoriais no Oriente Médio também afetou a Síria.
A Primavera Árabe iniciou na Síria em março de 2011, com movimentos pacíficos contra o governo que logo reagiu de maneira violenta aos protestos, resultando na morte de muitas pessoas e desencadeando a “Guerra na Síria”, que conhecemos hoje.
A Guerra na Síria, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), é uma das maiores crises humanitárias do século XXI, gerando diversos crimes de guerra e atentados aos direitos humanos, ocasionando várias mortes, com uma estimativa de que os primeiros 10 anos de guerra deixaram mais de 300 mil civis mortos de acordo com a ONU, e milhares de refugiados segundo a ACNUR.
O conflito atraiu atenção internacional devido à violência e complexidade geopolítica, envolvendo países regionais e potências globais. De acordo com Zimmermann (2016), essa guerra é vista como uma “guerra por procuração”(war by proxy), na qual terceiros indiretamente influenciam o conflito para avançar seus objetivos sem se envolverem diretamente na guerra.
Desde 2011 até hoje a Síria já passou por diversas intervenções humanitárias e/ou militares, sendo algumas dessas intervenções realizadas por Estados soberanos como os EUA, Reino Unido, França e Rússia. E além de Estados soberanos houveram também a realização de intervenções humanitárias por parte de OIS, como a Cruz Vermelha, Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), ACNUR e UNICEF, o Programa Mundial de Alimentos e ONGs como Save The Children (STC).
O território da Síria é geograficamente estratégico, uma vez que possui saída para o mar Mediterrâneo, e também detém muitos recursos naturais como fosfato, mármore, manganês, minério de ferro e o petróleo. Os recursos naturais de determinadas regiões e a abundância dos mesmos favorecem a ocorrência dos conflitos, justamente por conta da ganância das nações em controlar as rendas e o acesso físico a ela, portanto, as “intervenções humanitárias” também possuem interesses que vão além da preservação dos direitos e da vida humana, como suas ambições políticas, econômicas e estratégicas.
Para Immanuel Wallerstein, os Estados “centrais” têm ações imperialistas para com os Estados Periféricos e Semiperiféricos. As periferias ocupam a posição de fornecedores de recursos para o centro, tendo sempre que se alinhar e organizar sua economia visando os interesses de Estados centrais. Já para Andrew Linklater, a ideia de que organismos não estatais desempenham um papel significativo no cenário internacional é relevante, enfatizando também a importância da inclusão de atores locais na resposta humanitária.
Portanto, baseando-se na teoria de Wallerstein e Linklater, a Síria tem grande importância no fluxo de petróleo mundial dado sua localização além de possui outras matérias primas que são de grande interesse do centro, se traduzindo em um “aliado” ou “vassalo” com muito valor, os países centrais utilizam desse conflito a fim de proteger seus interesses e até mesmo como palco político para se promover diante do cenário internacional. Ressaltando também, a insensibilidade de países soberanos diante da falta de ética no conflito, apoiando atores não estatais como CICV, ACNUR e STC por lutarem em prol da ética, fornecendo itens básicos de sobrevivência e serviços para que eles pudessem ter uma vida digna a medida do possível.
REFERÊNCIAS:
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