
Ana Carolina Gomes – 7° semestre de Relações Internacionais da Unama
Segundo Clécius Filho et. al. (2019), a teoria dominante nas Relações Internacionais por muito tempo foi o realismo, cujo foco era na defesa do Estado, através da maximização do poder militar deste. Após a Guerra Fria, houve um novo arranjo no Sistema Internacional com o surgimento de novos atores. Os teóricos críticos ganharam destaque no terceiro debate das Relações Internacionais, cujo um dos principais nomes é Barry Buzan. Segundo o autor, é preciso discutir segurança para além de perigos exclusivamente militares; é necessário abordar questões de segurança nos âmbitos políticos, econômicos, sociais e ambientais.
Nessa perspectiva, nos anos 90, emergiu o conceito de Segurança Humana, cujo centro das discussões está na integração do desenvolvimento com questões humanitárias e de segurança (GEWEHR, 2022). Ao contrário dos debates clássicos, que se concentram na proteção do Estado soberano, as discussões sobre Segurança Humana direcionam-se para a salvaguarda do indivíduo. Uma vez que as novas ameaças, como a crise climática, passaram a ser uma preocupação global e não apenas exclusiva dos Estados. Desse modo, o objetivo central passou a focar na garantia dos direitos humanos fundamentais e em preservar a dignidade das pessoas (FILHO et al., 2019).
A migração climática representa um desafio tanto para as comunidades locais quanto para as políticas globais. Ela refere-se ao deslocamento de indivíduos causado direta ou indiretamente por fatores relacionados às mudanças climáticas. Isso pode englobar eventos como queimadas, desmatamentos, inundações, secas prolongadas, poluição de rios e outros impactos, como desastres ambientais, que tornam regiões não propícias à habitação. Dessa forma, as populações afetadas por esses fenômenos são forçadas a abandonar sua terra e a se deslocar em busca de condições de vida mais seguras, para esses indivíduos, utiliza-se a designação “Refugiado Climático” (WENDEN, 2016).
Segundo pesquisa do Banco Mundial, é estimado que até 2050 mais de 140 milhões de migrantes climáticos se desloquem dentro de seus países nas regiões da África Subsaariana, Ásia Meridional e América Latina (Rigaud et al., 2018 apud CARVALHO, 2021). No Brasil, em 2022, houve o registro de 708 mil deslocamentos internos devido a desastres naturais, um aumento significativo comparado a 2021 que obteve 449 mil registros. (IDCM,2022)
Neste contexto, considerando a alarmante deterioração da Amazônia e o crescente número de migrantes climáticos no território nacional, é essencial discutir como essa problemática impacta diretamente as comunidades locais.
As mudanças climáticas exercem impactos diretos nos povos originários. O aumento das temperaturas, a redução das chuvas e eventos climáticos extremos, como inundações e incêndios florestais intensos, têm consequências diretas na forma de vida dessas comunidades. Secas prolongadas, enchentes e a poluição de rios prejudicam a obtenção de recursos básicos para a sobrevivência deles, forçando diversos povos a adaptarem seus modos de vida ou os obrigando a deixar suas terras em busca de condições mais seguras. Essa problemática afeta a relação intrínseca dos indígenas com a natureza. (VICK, 2023)
Além disso, as comunidades ribeirinhas, também são forçadas a migrar devido à crise climática. As mudanças nos padrões de chuva, a contaminação dos rios e as inundações impactam a pesca, que é a principal fonte de sustento dessas comunidades, tornando-a mais escassa e imprevisível (LIMA, 2023). Além disso, alterações ambientais, como a construção da Usina de Belo Monte, também resultam em migrações forçadas. Em 2015, mais de 252 residências na Comunidade Santo Antônio, em Altamira, foram demolidas devido à sua localização estar no trajeto da Usina de Belo Monte. Diversos ribeirinhos, cuja subsistência dependia do rio Xingu, foram obrigados a abandonar seu modo de vida tradicional e migrar para outras regiões (Jusbrasil, 2015).
A migração climática é um fenômeno de natureza forçada que afeta principalmente os indivíduos mais vulneráveis, os quais enfrentam uma série de desafios para se adaptarem localmente ou se deslocarem para áreas mais seguras. Além disso, há pessoas em circunstâncias ainda mais críticas, impossibilitadas de realizar deslocamentos, o que as obriga a permanecer em regiões cada vez mais inviáveis. (Rigaud et al., 2018 apud CARVALHO, 2021)
Portanto, ao analisar a problemática da migração forçada dos povos amazônicos à luz do conceito de Segurança Humana, torna-se essencial que as discussões da agenda climática também abranjam a questão da migração. Isso se deve ao fato de que, embora afete milhões de pessoas em todo o mundo, ainda falta a implementação de políticas que assegurem o bem-estar desses indivíduos compelidos a migrar devido às mudanças climáticas.
No contexto da Amazônia, é crucial garantir a preservação das áreas onde esses povos tradicionais residem. O território transcende sua mera extensão geográfica; ele carrega consigo a riqueza cultural de um povo que merece ser protegida e preservada.
Diante do tema exposto, recomendamos a leitura do livro “Justiça Climática” (2021) de Mary Robinson. No livro, Mary Robinson, advogada, ex-presidente da Irlanda e enviada especial da ONU para mudança climática, reúne diversas histórias de pessoas de diferentes países que presenciam diariamente os efeitos das mudanças climáticas em suas vidas. As histórias recolhidas são frutos dos anos em que Mary participou de debates e congressos sobre direitos e clima. Para mais informações sobre, acesse:
Outrossim, recomendamos o trabalho realizado pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, criado em 1999, que desenvolve atividades por meio de programas de pesquisa, manejo de recursos naturais e desenvolvimento social, especialmente no Estado do Amazonas. Entre seus objetivos, estão a aplicação da ação de ciência, tecnologia e inovação de estratégias e políticas públicas de conservação e uso sustentável da biodiversidade amazônica. Para mais informações, acesse:
Site: < https://mamiraua.org.br/ >
Instagram: < https://www.instagram.com/institutomamiraua/ >
Facebook: < https://www.facebook.com/institutomamiraua/ >
Por fim, cabe destacar o Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará, referência na Amazônia no ensino ao nível de pós-graduação em desenvolvimento regional sustentável. Seus principais objetivos são a identificação, a descrição, a análise e interpretação e o auxílio na solução de problemas regionais amazônicos e a difusão de informações dentro da realidade amazônica, desenvolvendo e priorizando a interação entre o ensino, a pesquisa e a extensão. Para mais informações, acesse:
Site: < http://www.naraufpalbr/ >
Instagram: < https://www.instagram.com/naea.ufpa/ >
REFERÊNCIAS
DE CARVALHO, Pedro Minhaco. Refugiados Climáticos Intranacionais no Brasil: a Amazónia, a Degradação e a Migração Forçada. 2021.
DE WENDEN, Catherine Wihtol. As novas migrações. Revista Sur, 2016.
FILHO, Clécius. A Questão da Segurança Humana na Agenda de Segurança Internacional Pós-Guerra Fria. 2019.
GEWEHR, Luíza Luchi de Paulo. A garantia de segurança humana e o enfrentamento da armadilha da pobreza em estados frágeis: nexo entre desenvolvimento e segurança internacional. 2022.
Internal Displacement Monitoring Centre, 2022. Disponível em: https://www.internal-displacement.org/countries/brazil
LIMA, Wérica. Como a crise do clima impacta os ribeirinhos na Amazônia. Nexo, 2023. Disponível em: www.nexojornal.com.br/externo/2023/07/01/Como-a-crise-do-clima-impacta-os-ribeirinhos-na-Amaz%C3%B4nia
Ministério Público Federal. Jusbrasil, 2015. Disponível em : . https://www.jusbrasil.com.br/noticias/remocao-forcada-de-ribeirinhos-por-belo-monte-provoca-tragedia-social-em-altamira/203280827
VICK, Mariana. Como a mudança do clima afeta os povos indígenas no Brasil. Nexo, 2023. Disponível em: www.nexojornal.com.br/expresso/2023/04/26/Como-a-mudança-do-clima-afeta-os-povos-indígenas-no-Brasil
