Caio Farias Martins – 3°

Heitor Sena Passos – 7°

Rayana Yukari Fachinetti Inomato – Acadêmica de Relações Internacionais

A descolonização da África refere-se ao processo histórico pelo qual os países africanos almejaram e conquistaram sua independência política, cultural e, especialmente, econômica, com o objetivo de desvincular-se do domínio colonial e garantir sua autonomia em todos os aspectos.

Neste âmbito, a África do Sul se destaca, pois, apesar do Estado obter a exploração de recursos minerais como ouro e diamante em sua base econômica (Visentini, 2010), busca diversificar sua economia, visando aprofundar em setores como tecnologia, agricultura e turismo.  Destarte, torna-se fundamental discorrer sobre a base econômica da África do Sul para além do setor primário (exploração) e analisar a transição econômica na tentativa de redefinir sua identidade econômica na Divisão de Trabalho Internacional (DIT).

O país, que teve uma extensa colonização por parte de holandeses e ingleses até 1910, é banhado por oceanos, possui uma cultura diversa, é repleto de riquezas como carvão, ouro, cromo, diamantes, fosfatos, manganês, titânio, urânio, platina e vanádio e lidera a produção industrial, mineral e a geração de eletricidade do continente africano. Além de ser um potencial “hub” logístico da África meridional, “com boa infraestrutura portuária, rede de estradas de boa qualidade e um sistema financeiro desenvolvido” (BRASIL, 2022, online).

Segundo Visentini (2011), a mineração, historicamente, é a base da economia do país e de seu desenvolvimento, além de ser o ponto principal para a sua industrialização e corresponder a ⅓ de seu Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, o setor energético do país também é de suma importância, principalmente a partir de termelétricas de queima de carvão, contribuindo com 15% do PIB. 

É inegável a importância do setor primário para a economia sul-africana, mas também é compreensível que essa base econômica de exploração advém de fatores históricos externos, em principal a colonização, pois paralelamente ao desenvolvimento econômico dos países do norte global e sua industrialização, houve uma intensa exploração por parte dos mesmos no sul global, resultando em independências, industrializações e desenvolvimentos tardios. Nesse caso, compreende-se que enquanto holandeses e ingleses estavam se desenvolvendo, a África do Sul estava sendo explorada. 

Esse desequilíbrio econômico, desenvolvimentista e de ideais entre norte e sul global está em vias de cessação com a guinada político-econômica dos países que foram colonizados, buscando o protagonismo e o crescimento mútuo, além de uma transição de bases econômicas voltadas para bens estruturados e industrializados, buscando diminuir a dependência em relação a esses bens de outros países e aumentar sua autossuficiência em aspectos que antes lhe eram deficitários.

Segundo o relatório do Banco Africano de Desenvolvimento de 2022, a África do Sul está no topo dos rankings de industrialização do continente africano, tendo um grande desempenho em desenvolvimento nessa área e sendo uma importante parceira comercial. 

Além disso, faz parte do grupo/bloco “BRICS”, uma parceria de países em exponencial desenvolvimento econômico em conjunto com o Brasil, a Rússia, a Índia e a China, com o objetivo de cooperar nas áreas de: política, segurança, financeira e econômica, e cultural e pessoal. Segundo o site oficial do governo brasileiro:

O principal objetivo do bloco, por meio da cooperação, é alterar o sistema de governança global, com uma reforma de mecanismos como o Conselho de Segurança da ONU, além de introduzir alternativas às instituições como o FMI e o BID para o fomento às economias emergentes, como é o caso do NDB (BRASIL, s.d, online).

Sob outro viés, há um processo de diversificação econômica mundial nos dias atuais voltada para uma visão “verde e limpa”, visando a produção de redes de energias sustentáveis e uma base econômica que vise governança ambiental, social e corporativa (ESG, sigla em inglês), na qual a África do Sul busca se enquadrar, estreitando sua economia, energia e industrialização para um viés sustentável e com matrizes energéticas renováveis. O país adotou um plano de transição justa de energia a fim de transformar o setor elétrico do país (majoritariamente voltado para a queima de carvão) para geração de energia solar e eólica (THOMAS, 2022, online).

O plano sul-africano e sua guinada industrial e econômica “verde” são um imprescindível viés para demonstrar uma quebra na ideia/conceito de “Sistema-Mundo” de  Immanuel Wallerstein, de seu livro “Análisis de sistemas-mundo: una introducción” de 2005 e desenvolvida a partir do conceito de Divisão Internacional do Trabalho (DIT) estabelecida pelo sistema capitalista. Esse conceito se estrutura a partir do pensamento que o mundo é dividido em três áreas de hierarquia político-econômica: o centro, a periferia e a semi-periferia, onde:

Os países centrais ocupam-se da produção de alto valor agregado, os periféricos fabricam bens de baixo valor e fornecem commodities e matérias-primas para a produção de alto valor dos países centrais e, por fim, os países da semiperiferia, ora comportam-se como centro para a periferia, ora como periferia para os Estados centrais, tendo um papel intermediário.

Ou seja, demonstra a ruptura de um pensamento eurocêntrico e de hierarquia entre Estados e uma nova linha de desenvolvimento econômico para a produção para além de commodities e voltada para uma linha sustentável.

Para além, o economista estruturalista Raúl Prebisch (1949) compreende a ideia de centro-periferia, na qual a periferia se limitaria ao setor primário exportador enquanto o centro possuía uma economia diversificada com um amplo desenvolvimento técnico. Para a ruptura dessa dualidade, o país considerado parte da periferia buscaria a especialização de produtos de valor agregados por meio do progresso técnico-científico, em paralelo à exportação de bens primários, buscando se estabelecer como um exportador de produtos industrializados posteriormente. 

Prebisch, possui ideais voltados aos países latino-americanos, sugerindo maior integração entre eles visando a exportação de produtos industrializados entre si, mas que pode se encaixar para os países do sul global, como a própria África do Sul por meio do especialização técnico-científica e do desenvolvimento do setor terciário-quaternário e em cooperação com os outros países a partir do BRICS.

Nesse sentido, percebe-se que a forma como a África do Sul se insere na economia internacional é uma herança do período de colonização europeia. Não obstante, o país tem adotado medidas que visam diversificar a sua base  econômica e por investir na industrialização e na transição energética para fontes renováveis. Em decorrência disto, a África do Sul é um país que se destaca por possuir a economia mais desenvolvida do continente africano, colocando o país em posição de importante liderança regional na África, e, por sua vez, permitindo cada vez mais protagonismo para a África do Sul no cenário internacional.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. BRICS, A HISTÓRIA. s.d. Disponível em: https://www.gov.br/planalto/pt-br/assuntos/reuniao-do-brics/historia-do-brics. Acesso em: 20 jan 2024.

BRASIL. RELATÓRIO AGRONEGÓCIO ÁFRICA DO SUL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Secretaria de Comércio e Relações Internacionais, 2022.

GRUPO BANCO AFRICANO DE DESENVOLVIMENTO. Novo relatório do Banco Africano de Desenvolvimento e de parceiros constata que 37 países africanos se industrializaram na última década. 2022. Disponível em: https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/novo-relatorio-do-banco-africano-de-desenvolvimento-e-de-parceiros-constata-que-37-paises-africanos-se-industrializaram-na-ultima-decada-56801. Acesso em: 15 jan 2024.

PREBISCH, Raúl. El desarrollo económico de la América Latina y algunos de sus principales problemas. Santiago: CEPAL, 1949.

THOMAS, Jennifer Ann. Plano de transição justa de energia na África do Sul mostra modelo com parcerias internacionais e preocupação social. GLOBO, 2022. Disponível em: https://umsoplaneta.globo.com/clima/noticia/2022/11/22/plano-de-transicao-justa-de-energia-na-africa-do-sul-mostra-modelo-com-parcerias-internacionais-e-preocupacao-social.ghtml. Acesso em 22 jan 2024. 

VISENTINI, Paulo. África do Sul. [S. l.: s. n.], 2010. 50-51 p. Disponível em: https://funag.gov.br/loja/download/709-africa_do_Sul_-_Historia_Estado_e_Sociedade.pdf

. Acesso em: 2 jan. 2024.

VISENTINI, Paulo. O Livro na Rua – África do Sul. Editora Thesaurus, 2011. 

WALLERSTEIN, Immanuel. Análisis de sistemas-mundo: una introducción. Siglo XXI, 2005.