
Railson Silva (acadêmico do 7º semestre de RI da UNAMA)
Na literatura acadêmica recente, tem havido uma considerável atenção voltada ao papel das ideias nas relações internacionais. Esses estudos desencadearam um debate teórico entre os chamados “racionalistas” (positivistas) e defensores de epistemologias interpretativas (pós-positivistas) sobre a essência da realidade internacional e os métodos adequados para sua explicação. Entretanto, ao longo do tempo, o foco do debate tem se deslocado para os argumentos provenientes da abordagem construtivista das RI.
Primeiramente, a teoria construtivista se constitui principalmente durante a década de 1990, como alternativa para as teorias positivistas e pós-positivistas. Desde então, o construtivismo emergiu como uma das abordagens teóricas mais influentes no estudo das relações internacionais, integrando perspectivas da sociologia, filosofia e psicologia social. Além disso, possui uma diversidade interna, nas quais pode-se categorizar em construtivismo moderno ou sistêmico, que é a vertente mais adotada, além de variantes mais amplas do construtivismo, tais como o construtivismo crítico, o radical e o linguístico moderno (Adler, 2013)
Passando, então, à teoria, o construtivismo apresenta o seu primeiro postulado: a relação agente-estrutura é mutuamente constitutiva. A estrutura é entendida como a organização do conhecimento, representada por ideias às quais os indivíduos atribuem credibilidade (Wendt, 1999). Os construtivistas, em particular, concentram-se no conhecimento intersubjetivo, referindo-se às ideias partilhadas coletivamente e aos padrões comportamentais que emergem dessas concepções comuns (Wendt, 1999).
No entanto, “as estruturas só são produzidas e reproduzidas por práticas e interações” (Wendt, 1999). São as práticas dos agentes e a sua interação que criam e transformam a estrutura, sendo que a sua existência depende dos efeitos que tem nos agentes e no reconhecimento subjetivo por parte deles das regras e normas que a compõem (Wendt, 1987). Assim:
“agentes e estruturas como entidades mutuamente constitutivas, mas ontologicamente distintas. […] eles são “codeterminados”. As estruturas sociais são o resultado das consequências intencionais e não intencionais da ação humana, assim como essas ações pressupõem ou são mediadas por um contexto estrutural irredutível” (Wendt, 1987)
Portanto, o segundo postulado fundamental do construtivismo sustenta que os agentes se guiam não apenas por uma lógica consequencialista de análise custo-benefício, mas também operam conforme uma lógica de adequação. Limitar-se exclusivamente à perspectiva de custo-benefício seria desconsiderar o impacto dos fenômenos sociais e negligenciar a natureza endógena e variável dos interesses dos agentes, que frequentemente são moldados pelo efeito constitutivo da estrutura social (Wendt, 1999).
Entretanto, é importante destacar que os agentes não são meramente fantoches da estrutura; eles possuem reflexividade e uma capacidade de ação que é parcialmente independente dela. Isso nos conduz ao terceiro postulado: “As identidades são as causas mais imediatas de escolhas, preferências e ações” (Hopf, 1998), sem ignorar, contudo, a estrutura à qual, de fato, estão intrinsecamente ligadas.
Ademais, tendo por base a premissa ontológica de que os agentes são moldados pelo contexto social em que operam, os construtivistas investigam como esse processo se desenrola e quais são seus efeitos. O estudo conduzido por Risse et al. (1999) ilustra, por exemplo, como as normas internacionais sobre direitos humanos podem levar a mudanças comportamentais dentro de certos Estados. Além disso, os construtivistas dedicam-se a explorar os mecanismos e processos através dos quais os fatos sociais que constituem a estrutura social são criados, entendendo essa análise como crucial para decifrar como a estrutura, por sua vez, influencia o comportamento dos agentes.
Em suma, o construtivismo nas Relações Internacionais fornece ferramentas teóricas valiosas para entender a complexidade das interações globais, destacando o papel central das ideias, normas, e identidades na formação da política mundial. E reconhece que a estrutura das relações internacionais é socialmente construída, e não apenas determinada por fatores materiais, o construtivismo destaca como as percepções e interações dos atores contribuem para a criação da realidade internacional.
Referências:
Adler, E. ‘Constructivism in International Relations: Sources, Contributions, and Debates’, in Carlsnaes, W., Risse, T., and Simmons, B. (eds) Handbook of International Relations. London: SAGE Publications Ltd, pp. 112–144, 2013.
Wendt, A. Social Theory of International Politics. Cambridge: Cambridge University, 1999.
Wendt, A. E. ‘The agent-structure problem in international relations theory’, International Organization, 1987.
