Thais Borges – acadêmica do 7° semestre de Relações Internacionais (UNAMA)

A partir dos anos de 1980, iniciavam os indícios de que o campo epistemológico das Relações Internacionais estava em crise, tal cenário era sentido na dificuldade de adequar as teorias, conceitos e os modelos de pensamentos tradicionais à realidade que se apresentava. Essa crise não se restringia entretanto apenas as RI, era reverberada nas Ciências Humanas como um todo e tinha em sua raiz a crítica e ruptura com as promessas iluministas que até então constituíam as bases desses saberes. Se tratou de um período de questionamentos ao racionalismo, positivismo e do progresso que estes acarretariam à sociedade humana. 

Nesse sentido, tendo em vista as consequências da modernidade sobre o homem, o sociólogo Max Weber (apud RESENDE, 2010, p. 27) afirmou que a ascensão da sociedade moderna e do capitalismo geraram uma cultura racionalista, estruturada pela técnica, cálculo estratégico e esvaziada das realidades mágicas, resultando assim em um “desencantamento” do homem ao se valorizar mais o conhecimento científico do que as crenças e os valores. Assim, percebia-se que o iluminismo ao invés da emancipação e transcendência do homem pela razão, no contexto moderno, acorrentava-o a burocracias, à técnica, ao consumismo e disciplinarização. Era necessário portanto buscar novas alternativas, óticas que pudessem analisar de maneira crítica tal cenário, é neste contexto que os estudos pós-modernistas se iniciam. 

No campo das RI, um fator decisivo que implicou a necessidade de rever os fundamentos tradicionais da disciplinas foi o fim da Guerra Fria. A expansão e consolidação das RI se desenvolveu sob o período e lógica referencial da bipolaridade entre os EUA e a URSS, entretanto, com o fim desta, a geopolítica e o campo epistemológico que estruturavam o campo precisavam ser redesenhados de modo a conseguir interpretar o contexto vigente (RESENDE, 2010). Implica também a expansão da disciplina para novos campos de conhecimento, acrescentando assim estudos Pós-Coloniais, de Gênero e Críticos. 

Os trabalhos desenvolvidos por teóricos identificados com o pós-modernismo nas RI tem como base a reflexão crítica sobre o contexto histórico e a identidade da disciplina, e o objetivo de reavaliar os valores cristalizados e que se tornaram senso comum no campo, estes ancorados em pensamentos positivistas. 

Assim, partindo do pressuposto de que o mundo se constrói socialmente, são preocupados com os discursos e as metanarrativas, a ética, a revisão metodológica e epistemológica dentro da área, e as consequências da modernidade. Com isto, o pós-modernismo trouxe a ética para o centro dos debates de uma disciplina que até então estava focada no exercício do poder estatal.

Uma das principais contribuições à disciplina foi a revisão do conceito do Estado, criticando assim as bases das teorias Estado-cêntricas. Richard K. Ashley, um dos principais expoentes da corrente, em “The Poverty of Neorealism” (1984), aponta a posição impassível de questionamentos que o Estado ocupa para os Neorrealistas, observando que este é tratado como uma premissa básica natural para os autores desta teoria. 

O ponto que Ashley questiona é que o Estado não é uma unidade natural e imutável, as fronteiras que separam e definem os Estados foram construídas e intencionalmente firmadas para diferenciar o interno do externo, ou em outras palavras, a ordem e segurança que um Estado proporciona, da desordem e do caos que assolam o outro lado da fronteira. 

Portanto, para Ashley (1984), os Estados são produtos e se mantêm pelo exercício político, de tal modo que este está na constante de ser constituído e afirmado através dos discursos, narrativas e políticas dominantes. Sua crítica quanto a visão do Estado ser tratado como entidade natural é que estas desconsideram cenários que ultrapassam as linhas imaginadas de fronteiras como em situações de migração e refúgio. Assim, o autor traz para o debate a necessidade de indagar um pressuposto que até então era visto como objeto natural e verdade absoluta de uma das principais correntes das RI.

Em conclusão, os estudos pós-modernos perturbam o status quo das Relações Internacionais, ao questionar os discursos dominantes da área, desconstruir conceitos e desestabilizar teorias, metodologias e epistemologias. A perturbação que os pensadores pós-modernos acarretaram à disciplina abriu espaço para novas reflexões e questionamentos das crenças, verdades e premissas do campo, sendo assim de importante papel para a constante construção das RI. 

Referências

ASHLEY, Richard. 11 The achievements of post-structuralism. International theory: Positivism and beyond, p. 240, 1996.

ASHLEY, Richard K. The poverty of neorealism. International organization, v. 38, n. 2, p. 225-286, 1984.

DEVETAK, Richard. Post-structuralism. Theories of international relations, p. 183-211, 2009.

RESENDE, Erica Simone Almeida; SENHORAS, Elói Martins; CAMARGO, Julia Faria. A crítica pós-moderna/pós-estruturalista nas relações internacionais. EdUFRR, 2010.