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Rayana Yukari Fachinetti Inomato – Internacionalista
O ato de contratar o serviço de mercenários para entrar em um conflito é uma prática que pode ser observada desde a antiguidade. Nos dias atuais, conforme Amanda D’Avila (2023), a venda de serviços militares a atores estatais e não estatais é realizada por Empresas Militares Privadas (EMPs), que, ao desempenhar um papel no conflito fornecendo os próprios recursos, apresenta-se como uma alternativa menos custosa financeira e politicamente para um estado contratante.
Em decorrência disso, as EMPs têm se tornado cada vez mais presentes nos conflitos em andamento, como exemplificados no caso da Colômbia e na Guerra no Iraque e no Afeganistão, os quais, segundo G1 (2023), “os terceirizados chegaram a representar 50% ou mais do efetivo americano nesses países.”
Entretanto, a maior participação de empresas privadas em operações militares, outrora dominadas pelas forças armadas dos Estados, trouxe consigo questionamentos acerca das suas implicações no sistema internacional. Segundo Gomes (2023), há uma falta de mecanismos de regulamentação e fiscalização para gerenciar a atividade das EMPs, que muitas vezes cometem transgressões e geram danos à população local.
Sendo assim, a atuação das EMPs no sistema internacional levanta dúvidas acerca da soberania dos estados nacionais sobre controlar a atividade dessas empresas, bem como às consequências negativas que trazem à sociedade civil. Desse modo, há de se discorrer sobre a forma como a lógica do mercado, priorizando o lucro acima de tudo, têm remodelado a dinâmica das operações militares na contemporaneidade.
Destarte, ao compreender sobre o surgimento desse novo ator no Sistema Internacional no âmbito militar, que diferencia as antigas guerras para a “Novas Guerras” (Kaldor, 2006), é notório entender que a opção por parte do Estado por autorizar a entrada de EMP’s, os quais visam diretamente o lucro, vai em contraposição com a defesa da soberania militar em seu território nacional.
Outrossim, tais serviços ofertados pelas EMP’s começa a ser viável e atrativas para países que buscam aprimorar a segurança nacional, uma vez que não obtém capacidades bélicas suficientes para resguardar seus interesses, apropriando de serviços militares especializados privados ofertados por tais empresas (Kowalski, 2009).
De maneira análoga, ao analisarmos este panorama por uma perspectiva Realista Estrutural do teórico Kenneth Waltz, com enfoque na obra “The Man, The State and War” (1954), é evidente que as EMP’s são mecanismo possíveis que o Estado possui para garantir sua segurança. Diante dessa obra, o autor afirma que o Sistema Internacional é estruturalmente caracterizado por ser anárquico, devido à ausência de uma figura “hegemon” que dite o funcionamento do S.I.
Além disso, em suas teses, argumenta que essa característica é a motivação primordial que incentiva os Estados a almejarem poder e a competir por sua segurança, em resposta à natureza anárquica do sistema internacional, moldando as interações interestatais (Waltz, 1954). Nesse sentido, deslocando a visão de Kenneth Waltz, o surgimento das empresas militares privadas se revela como uma oportunidade para os Estados obterem recursos bélicos avançados, visando à proteção de sua segurança nacional diante de um Sistema Anárquico.
Entretanto, como já mencionado anteriormente, tais práticas podem ser prejudiciais ao próprio contratante. Isso se deve à terceirização de serviços estatais para corporações que não estão necessariamente alinhadas com os interesses do Estado-nação, mas sim com os interesses do capital e como essa dinâmica também, conforme Mateus Kowalski (2009), “contribuir significativamente para uma crise de identidade das forças armadas”, repassando funções estatais essenciais para corporações econômicas.
Nesse viés, compreende-se que a lógica de lucro do mercado influencia diretamente nas operações militares no sistema internacional e há tanto benefícios quanto malefícios a ser melhor discutidos e regularizados para atingir um objetivo de interesse coletivo. A insegurança do Estado-nação e de sua soberania demonstrada nessa óptica se estabelece com estopim a ser melhor discutido sobre as EMP’s e políticas voltadas a essa questão se mostram como um ponto de interesse nacional.
Por conseguinte, é expressiva a importância dessa questão para as relações disputativas hegemônicas mundiais, principalmente em relação ao “fortalecimento” de um Estado contratante sem recursos militares ou que não desejam se atrelar diretamente em relação à nacionalização de um contingente militar. Essa alternativa, menos custosa econômica e politicamente, é uma maneira indubitável de expandir poderio apesar de sustentar controvérsias.
Referências:
G1. Além da Rússia, vários países contratam grupos privados para atuar em guerras ou zonas de conflito. 26 jun. 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2023/06/26/alem-da-russia-varios-paises-contratam-grupos-privados-para-atuar-em-guerras-ou-zonas-de-conflito.ghtml. Acesso em: 8 abr. 2024.
GOMES, Amanda D’Avila. A terceirização da guerra e a atuação das Empresas Militares Privadas: o caso colombiano. 2023. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de Relações Internacionais, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. doi:10.11606/D.101.2023.tde-14062023-114952. Acesso em: 2024-04-02.
Kaldor, Mary (2006) New and old wars – organized violence in a global era. Cambridge: Polity Press.
WALTZ, Kenneth. (1954), Man, the State and War. New York, Columbia University Press.
