
Julia Castro, acadêmica do 5º semestre de Relações Internacionais
Ficha Técnica:
Ano: 1976
Direção: Sidney Lumet
Distribuição: Metro-Goldwyn-Mayer
Gênero: Drama, Comédia
País de Origem: Estados Unidos
Considerado pelo American Film Institute um dos melhores clássicos do cinema americano e vencedor de quatro estatuetas do Oscar, “Rede de Intrigas” aborda o sensacionalismo midiático e a busca incessante por audiência de forma satírica e crítica. Em suma, um âncora veterano de uma rede de televisão é demitido devido a baixa audiência de seu programa. Ele então, ameaça cometer suicídio ao vivo, o que acaba aumentando os índices de audiência da emissora e leva os executivos a explorar a situação para lucro próprio.
A narrativa retrata a fictícia rede de televisão americana, Union Broadcasting System (UBS), lutando contra seus baixos índices de audiência. Howard Beale, um popular âncora de notícias da UBS, recebe a notícia através de seu amigo e presidente da divisão de notícias, Max Schumacher, que ele tem apenas mais duas semanas no ar. Beale anuncia sua demissão e também, no ar, que se matará no próximo programa, sendo retirado às forças e afastado do programa. A UBS tenta demitir Beale imediatamente, mas Schumacher intervém para que ele possa de desculpar publicamente. Mais uma vez no ar, ele faz uma crítica severa ao tédio da vida. O discurso de Beale faz com que a audiência dispare e os executivos do UBS aproveitem a situação para ganhar audiência.
A ambiciosa diretora de programação, Diana Christensen, é uma grande fã da contracultura e do anti-establishment, por isso se interessa por um programa próprio para Beale. Quando Schumacher recusa a proposta, Christensen convence seu chefe, Frank Hackett, a colocar o noticiário na divisão de entretenimento, explorando a loucura do apresentador. Em mais um discurso, Beale escandaliza a nação, persuadindo os telespectadores a gritarem “estou louco e não vou aguentar mais isso” de suas janelas. Mais tarde, ele ganha um programa próprio chamado “The Howard Beale Show”, conhecido como “o profeta louco”. O programa se torna líder de audiência e Beale espalha a sua mensagem populista furiosa na frente de uma audiência ao vivo que ecoam a sua frase de efeito: “Estamos loucos e não vamos aguentar mais isso!”
Explorando os bastidores sensacionalistas e controladores da indústria da televisão, podemos relacionar a obra cinematográfica com as Relações Internacionais a partir do conceito de Indústria Cultural, presente na Escola de Frankfurt. Através de pensadores como Theodor Adorno, Max Horkheimer e Herbert Marcuse, a Escola de Frankfurt critica a indústria cultural e a sua influência na sociedade, realizada através de um controle social. Uma das formas que a indústria cultural exerce seu controle sobre os consumidores, explicam Adorno e Horkheimer, é por meio da diversão: “A mecanização atingiu tal poderio sobre a pessoa em seu lazer e sobre a sua felicidade, que esta pessoa não pode mais perceber outra coisa senão as cópias que reproduzem o próprio processo de trabalho. O espectador não deve ter necessidade de nenhum pensamento próprio, o produto prescreve toda a reação” (ADORNO E HORKHEIMER, 1985). O longa-metragem aborda essa crítica de forma excelente ao explorar o papel da mídia de massa na manipulação da opinião pública e na perpetuação de agendas ocultas, mostrando que o sensacionalismo é o resultado direto da industrialização da cultura.
É importante ressaltar o contexto histórico em que o filme foi lançado, na década de 1970. Com a Guerra do Vietnã, o escândalo de Watergate e a crise do petróleo, os americanos se viram diante de tantos conflitos políticos e sociológicos que a indústria cinematográfica se tornou um dos principais meios para abordar os dilemas que acometiam os cidadãos na vida cotidiana (CAMPOS, 2016). Nesse contexto, um apresentador destemido como Howard Beale representa a raiva do povo, criticando as mazelas da sociedade. Em busca de audiência, Diana tenta desenvolver um programa com imagens exclusivas de grupos revolucionários assaltando bancos. Na obra “O Homem Unidimensional”, Marcuse trata da sociedade industrial avançada, na qual a racionalidade tecnológica e o consumo de mercadorias desenvolvem um processo de adaptação à sociedade opressora dos indivíduos que nela vivem (OLIVEIRA, 2017). Segundo o autor: “Os privilégios expressaram a injustiça da liberdade, a contradição entre ideologia e realidade, a separação da produtividade material e intelectual; mas eles também ofereceram um reino protegido no qual as verdades proibidas puderam sobreviver em uma integridade abstrata – distanciadas da sociedade que as suprimia” (MARCUSE, 2015).
“Rede de Intrigas” é uma poderosa crítica ao chamado “capitalismo tardio”, onde ocorre uma industrialização generalizada e sem precedentes não só para a produção de mercadorias, mas em todos os setores da vida social (FERREIRA, 2013). A sátira do filme não mira apenas do desespero dos executivos da UBS por audiência, mas também como eles usam essa audiência para manipular toda uma nação. Um filme lançado há quase 50 anos atrás, mas que permanece atual, principalmente o avanço da globalização e da tecnologia.
REFERÊNCIAS:
ADORNO, Theodor W. & HORKHEIMER, Max. (1985), Dialética do Esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.
CAMPOS, Leonardo. CRÍTICA | REDE DE INTRIGAS (1976). Plano Crítico. 2016. Disponível em: https://www.planocritico.com/critica-rede-de-intrigas-1976/
FERREIRA, Wilson. O evangelho do capitalismo tardio no filme “Rede de Intrigas”. Cinema Secreto: Cinegose. 2013. Disponível em: http://cinegnose.blogspot.com/2013/02/o-evangelho-do-capitalismo-tardio-no.html
MARCUSE, Herbert. O homem unidimensional. São Paulo, Edipro, 2015.
OLIVEIRA, Robespierre. A Atualidade De Marcuse: Contrarrevolução E Resistência. Revista Ideação, N. 36, Julho/Dezembro 2017.
