Lucas Cardoso acadêmico do 3° Semestre de RI da UNAMA

Matheus Castanho Virgulino, internacionalista

A Guerra Guaranítica, ocorrida entre 1754 e 1756, foi um conflito armado envolvendo os índios guaranis das Missões Jesuíticas e as forças coloniais espanholas e portuguesas na região do atual sul do Brasil, nordeste da Argentina e Paraguai. Este confronto foi desencadeado pela implementação do Tratado de Madri, que redefiniu as fronteiras coloniais e forçou a relocação das populações indígenas. A resistência dos guaranis, liderada por Sepé Tiaraju, foi uma defesa fervorosa contra as imposições coloniais. A guerra resultou na dispersão das comunidades missionárias, destruição de aldeias e grande perda de vidas. Este episódio trágico na história da resistência indígena ao colonialismo na América do Sul destacou a luta e o sacrifício dos guaranis por sua autonomia e identidade.

No contexto das tensões Europeias, enebriada no conflito da Guerra dos 7 anos, surgia o medo de que as colônias sul-americanas se tornassem um novo campo de batalha, como ocorrera nas possessões inglesas e francesas na América do Norte. Isso, agravado pelas incursões de bandeirantes portugueses em colônias espanholas, gerou uma atmosfera de hostilidade nas potências ibéricas. O resultado foi o Tratado de Madri celebrado em 1750 entre as coroas da Espanha e de Portugal onde, por meio do princípio de Uti Possidetis, ocorreu uma redistribuição de seus territórios para melhor adequar-se à ocupação efetiva dos mesmos (Fausto, 1994). Na prática, foi uma atualização do anterior Tratado de Tordesilhas na era das navegações.

O reordenamento territorial na região ao entorno do Rio de La Plata entre os impérios de Espanha e Portugal foi a causa imediata do conflito, pois o mesmo, além de ditar a troca dos territórios de Sacramento e Siete Pueblos de las Missiones, também implicaria a deslocação forçada das populações ameríndias ali insertas, assim como a demarcação de seus territórios que foram povoados e desenvolvidos por meio das missões jesuítas (Ganson, 2003). Estes assentamentos, outrora promovidos pelas colônias católicas como maneira de, ao seu ver, civilizar os índios, agora demonstrava-se um impencilho, já tendo se consolidado uma relativa autonomia indígena por intermédio jesuíta.

Não obstante, os jesuítas dependiam do patronado real para a sua contínua existência, o que os fez buscar a aquiescência dos indígenas Guaranis para que se retirassem das terras. As lideranças Guaranis da província de Siete Pueblos ainda assim recusaram-se a atender os desígnios de Madrid, e se confederaram sobre a liderança do chefe Sepé Tiaraju.

A guerra, que durou de 1754 até 1756, foi uma das maiores investidas colonizadoras contra uma confederação indígena desde os primórdios da ocupação territorial latino-americana pelas potências Europeias. Com forças coordenadas vindas de São Paulo e Rio de Janeiro por parte dos portugueses e de Buenos Aires por Parte dos Espanhóis, uma longa ofensiva de atrição foi lançada contra os indígenas das sete cidades da província (Golin, 2011). A guerra, na sua maior parte, limitou-se à um conflito de guerrilha, onde a confederação dos Guaranis compensou seus menores números com ataques coordenados de cavalaria e pelas matas contra as rotas de suprimento das forças conjuntas ibéricas.

Apesar de um sucesso inicial, os Guaranis ficavam em desvantagem em batalhas de campo aberto, onde o treinamento e superioridade tecnológica dos exércitos ibéricos mostravam-se mais eficazes. Além disso, povoados e fazendas indígenas foram sistematicamente atacados, o que diminuiu as chances de embate por parte dos Guaranis. O chefe Sepé Tiajuru veio a morrer em uma emboscada, e as últimas forças da confederação Guarani foi derrotada na batalha da colina de Caibaté em 1756 (id.).

A guerra demonstrou a dificuldade de reordenar o território nas margens do Rio da Prata, fazendo com que muitas das provisões do Tratado de Madrid não fossem amplamente cumpridas, porém havendo, na maior parte, o fim das missões jesuítas e o deslocamento dos indígenas. Mais importantemente, o conflito em si é uma amostra da mentalidade que direcionou a expansão colonial na américa do sul, onde, s autoridade absolutista de uma entidade política estrangeira, suprimia a autodeterminação e desenvolvimento local. Entrando no ethos da resistência dos povos americanos face à Europa, a Guerra Guaratínica foi uma precursão do declínio do projeto colonizador ibérico, que viria a entrar finalmente em colapso com as guerras de independência no começo do século XIX.

REFERÊNCIAS:

FAUSTO, Boris. HISTÓRIA DO BRASIL. São Paulo: Edusp, 1994.

GANSON, Barbara. THE GUARANÍ UNDER SPANISH RULE. Stanford: Stanford University Press, 2003.

GOLIN, Tau. CARTOGRAFIA DA GUERRA GUARATINÍCA. Primeiro Simpósio Brasileiro de Cartografia Histórica, 2011. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/255232135/Cartografia-da-Guerra-Guarani-tica-Tau-Golin