
Stefany Louise Campolungo Rodrigues – Acadêmica do 8º semestre de Relações Internacionais da Universidade da Amazônia
O estudo das Relações Internacionais como disciplina acadêmica nasce logo após a Primeira Guerra Mundial e ao longo do século XX, especialmente nas décadas de 1920 e 1930, houve um surgimento de publicações que contribuíram para a construção da base teórica das RI para compreender melhor as dinâmicas entre os Estados e as transformações na ordem internacional. Inicialmente, as teorias das Relações Internacionais clássicas se concentravam nas relações entre Estados soberanos, com foco na diplomacia, guerra, paz e equilíbrio de poder. As teorias predominantes incluem o Realismo, que destaca a competição e o poder como motivadores das ações dos Estados, e o Idealismo, que defende a cooperação internacional e o direito internacional como meios para promover a paz e resolver conflitos (MACÊDO, 2017).
No entanto, à medida que o século XX ia passando, com ele ia surgindo novos métodos e debates que viam as relações internacionais com outros olhos. Com isso, o terceiro debate das RI traz enfoques que antes não eram vistos como necessários para a compreensão do Estado. Após o fim da Guerra Fria, a virada construtivista ocorre nas Relações Internacionais, questionando as abordagens tradicionais tanto liberais quanto realistas. Essa virada destacou a importância da construção social da política mundial, criticando a visão histórica e social do sistema internacional. O pós-positivismo dentro das RI foca na compreensão das normas e instituições que moldam as ações dos Estados, considerando a existência de “identidades estatais” moldadas por atores domésticos e externos, influenciando decisões de política externa (MONTE, 2013).
Dentre eles, o estudo de gênero se baseia na Teoria Feminista das Relações Internacionais, que utiliza o gênero como categoria de análise para explorar a assimetria nas relações de gênero e as formas como as identidades masculinas e femininas são constituídas nas instituições e normas do sistema internacional. Segundo V. Spike Peterson e Anne S. Runyan (1999), há duas principais formas de trabalhar o gênero como categoria de análise: a primeira denominada “posição das mulheres”, que foca na inclusão das mulheres nos espaços e nas discussões que tradicionalmente as excluíram das teorias de RI. Já a segunda abordagem é o “poder do gênero”, onde não apenas localiza as mulheres em suas posições marginalizadas, mas examina como essas posições estão ligadas ao sistema de símbolos que define e mantém as normas de gênero, resultando entender o gênero não como atributo biológico, porém como um conjunto de símbolos sociais que influenciam a interpretação da realidade e orientam comportamentos individuais e políticos.
Já para J. Ann Tickner (2001), as normas de masculinidade influenciam na definição de identidades e comportamentos do Estado, destacando a masculinidade hegemônica como um ideal que enfatiza características como agressão, competitividade e afirmação dessa autonomia. A autora justifica a identificação pela predominância histórica de homens nas esferas decisórias, argumentando que modificar as dinâmicas conflitivas das RI requer a inclusão de um ponto de vista distinto na produção de teoria e formulação política.
Além disso, existem outras vertentes do feminismo no estudo de gênero como o feminismo liberal, que foca na eliminação das desigualdades de gênero através da extensão dos direitos civis e políticos das mulheres. Vendo o Estado como um agente crucial para promover a igualdade, apesar das práticas discriminatórias ainda presentes. Já o feminismo radical diverge ao afirmar que a opressão das mulheres vai além das barreiras legais, permeando profundamente as instituições sociais sob um sistema patriarcal. O feminismo socialista destaca a opressão das mulheres com suas raízes na divisão entre trabalho produtivo e reprodutivo, onde o controle masculino sobre o trabalho reprodutivo sustenta o sistema capitalista, desvalorizando e não remunerando adequadamente o trabalho doméstico das mulheres (MONTE, 2013).
Em conclusão, após a Guerra Fria, o sistema internacional se distanciou das tradicionais preocupações com segurança e alta política, ampliando o espaço para questões de outras agendas. Nesse contexto, as abordagens feministas ganharam destaque ao identificar as margens do meio internacional. Contudo, essa mudança se deve aos novos instrumentos teóricos utilizados para interpretá-lo e entendê-lo. O terceiro debate deve ser visto como algo positivo que sustenta um espaço contínuo de negociações e conversações. No entanto, o campo ainda continua a praticar exclusões que impedem a realização dessas conversas, excluindo experiências, corpos e lugares sociais daqueles historicamente definidos como “outros” na teoria (SYLVESTER, 1994).
Referências
MACÊDO, M. Gênero e Relações Internacionais – a inserção da mulher na esfera política e na carreira diplomática brasileira. Brasília, abr. 2011. Disponível em: <https://bdm.unb.br/bitstream/10483/1997/1/2011_MarinaMacedoMendes.pdf>.
MONTE, I. X. DO. O debate e os debates: abordagens feministas para as relações internacionais. Revista Estudos Feministas, v. 21, n. 1, p. 59–80, abr. 2013.
PETERSON, Spike V., and RUNYAN, Anne S. Global Gender Issues – Dillemas in World Politics. Colorado: Westview Press, 1999.
SYLVESTER, Christine. Feminist Theory and International Relations in Postmodern Era. Cambridge: Cambridge University Press, 1994.
TICKNER, J. A. Gendering world politics : issues and approaches in the post-Cold War era. New York, N.Y.: Columbia University Press, 2001.
