Maria Luiza Garcia Lira – acadêmica do 2º semestre de Relações Internacionais da Unama.

O feriado estadual de 15 de agosto, criado pela Lei n° 5.999/1996, celebra o Dia da Adesão do Pará à Independência do Brasil. Há 201 anos, as autoridades da Província do Grão Pará colocavam fim ao domínio de Portugal sobre o território do estado, que passava a compor o Império do Brasil quase um ano depois da independência da Coroa Portuguesa. (PARÁ, 1989)

Esse fato histórico, no entanto, precede e sucede conflitos políticos e violentos. A elite presente no estado tinha grande influência dos lusitanos e não queria abdicar de seus privilégios políticos, além disso, a presença de militares que juraram fidelidade ao Dom João VI, que retornou à Portugal sob pressão de parte da Corte Portuguesa para se submeter a uma nova constituição e assegurar a estabilidade do reino, resistiam ao processo de adesão à independência de Portugal. (BBC, 2021)

 Nesse sentido, Dom Pedro I enviou o comandante inglês John Grenfell à Belém para coagir as autoridades da província pela assinatura do documento de adesão, prometendo manter seus privilégios e bens, desde que assinassem os registros jurando fidelidade ao filho do antigo imperador, sob a possibilidade de bloquear o acesso ao porto marítimo com uma frota de navios, na cidade de Salinópolis, e bombardear a capital paraense com o Brigue Maranhão, caso a adesão não fosse efetivada. (ALEPA, 2023)

Em contrapartida, as populações marginalizadas, como pequenos comerciantes, pobres e escravos apoiavam o processo de adesão visando à melhoria das condições socioeconômicas e maior participação política, o que seria o início da construção de uma identidade cultural brasileira entre o povo paraense dentro do império recém formado. O momento histórico foi celebrado festivamente no dia 15 de agosto de 1823 ao lado de fora do Palácio Lauro Sodré pela população que ansiava as melhorias.

 Contudo, o momento pós-adesão não trouxe nenhum desenvolvimento socioeconômico significativo e nem participação política do povo paraense, contribuindo, assim, com a ascensão de um descontentamento de parte da população que reivindicaria melhorias. Dentre diversas manifestações, o Massacre do Brigue Palhaço se destaca pela violência excessiva contra os revoltosos. Parte das tropas e da população paraense clamava melhorias salariais, fim dos privilégios dos portugueses e outras demandas socioeconômicas, o que desagradou autoridades e o almirante Grenfell, que ordenou o envio dos presos ao porão do navio, onde morreram mais de 250 pessoas envenenadas e asfixiadas pelas ordens do militar inglês. (UFPA, 2017)

Como consequência da tragédia, algumas investigações foram feitas, dentre elas, uma ordenada por Dom Pedro I; embora não tenha resultado qualquer punição a John Grenfell. Em conformidade com a injustiça sofrida pela população, o sentimento de revolta e indignação criou um sentimento de identidade e de necessidade de justiça e mudança, que eclodiria em outras revoltas populares ao longo dos anos.

Assim, esse processo de construção de uma identidade brasileira no povo do norte do Brasil antecedeu a Revolta dos Cabanos. Em 1831, quando Dom Pedro I abdicou do trono, o país era marcado pela instabilidade política, pelas revoltas populares e por grupos políticos que desejavam uma mudança na administração das terras brasileiras. Por ser menor de idade, Dom Pedro II não poderia assumir o trono do império e o Brasil passaria a ser comandado por regentes que indicavam os presidentes das províncias que formavam o território brasileiro. (ALEPA, 2022)

O então presidente da província, Bernardo Lobo de Souza, agia com autoritarismo, violência e até deportava e prendia opositores; logo, em 1835, os cabanos se agruparam e executaram o governador do Grão Pará. A Revolta da Cabanagem durou 5 anos e, apesar da brevidade, o povo tomou o poder temporariamente. Já em 1840, as tropas enviadas pelos regentes do império colocaram fim ao movimento marcado pelas traições entre os próprios líderes do movimento e por muita violência, que dizimou mais de 30% da população da província. (ARQUIVO NACIONAL, 2022)

Alguns revolucionários ainda conseguiram escapar das tropas do imperador e fugiram para as áreas de floreta, multiplicando os quilombos na região, sendo fundamentais como resistência dos africanos escravizados e seus descendentes.  Com o golpe da maioridade e Dom Pedro II ascendendo ao trono brasileiro, inicia-se uma nova fase da história do povo nortista.

Referências:

ARQUIVO NACIONAL. Cabanagem: a revolução das “classes ínfimas”. Brasil, 24 de maio de 2022. Disponível em: https://www.gov.br/arquivonacional/pt-br/sites_eventos/sites-tematicos-1/brasil-oitocentista/temas-oitocentistas/cabanagem-a-revolucao-das-201cclasses-infimas201d. Acesso em: 13 de agosto de 2024.

ALEXANDRE, Rosa. Revolta da Cabanagem completa 187 anos neste mês. ALEPA. Pará, 24 de janeiro de 2022. Disponível em: https://www.alepa.pa.gov.br/Comunicacao/Noticia/8110. Acesso em: 13 de agosto de 2024.

BARCELLOS, Mara. Adesão do Pará celebra a Independência e destaca-se como Data Magna no Estado. ALEPA. Pará, 14 de agosto de 2019. Disponível em: https://www.alepa.pa.gov.br/Comunicacao/Noticia/7352. Acesso em: 14 de agosto de 2024.

BOUÇÃO, Carlos. 200 anos de Adesão da Província do Pará à Independência da República do Brasil. ALEPA. Pará, 15 de agosto de 2023. Disponível em: https://www.alepa.pa.gov.br/Comunicacao/Noticia/8982#:~:text=15%20de%20agosto%2C%20o%20feriado,ap%C3%B3s%20a%20independ%C3%AAncia%20do%20Brasil. Acesso em: 13 de agosto de 2024.

PARÁ, Constituição. Constituição do Estado do Pará. 2. ed. Belém: Assembleia Legislativa do Estado do Pará, 1989.

PORTAL UFPA. Pesquisadora da UFPA explica a história do feriado de 15 de agosto. Pará, 14 de agosto de 2017. Disponível em: https://portal.ufpa.br/index.php/ultimas-noticias2/406-pesquisadora-da-ufpa-explica-a-historia-do-feriado-de-15-de-agosto. Acesso em: 13 de agosto de 2024.

VEIGA, Edson. Há 200 anos, Dom João 6º voltava a Portugal e, sem querer, abria caminho para a Independência do Brasil. BBC News. Brasil, 24 de abril de 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56857790.amp. Acesso em 15 de agosto de 2024.