
Matheus Castanho Virgulino – Internacionalista
Ana Gabriela de Souza e Silva – 2° semestre
As Cruzadas foram campanhas militares promovidas por governantes e líderes religiosos com a intenção de espalhar o cristianismo e reaver a Terra Santa e Jerusalém, lugares de grande significado para os cristãos (CARTWRIGHT, 2018). As Cruzadas Bálticas ou do Norte, foram campanhas concentradas na conversão de povos pagãos e hereges em cristãos. Embora com esse fim, os cavaleiros eram motivados pela aquisição de terras e riquezas (CARTWRIGHT, 2018). Culminando em mais uma jornada em busca de poder e dominação, tanto religiosa quanto material.
As Cruzadas do Norte inserem-se em um determinado processo histórico que se iniciou em meados do século IX e findou-se com a crise do século XIV: a expansão geográfica e cultural da Europa. Conforme afirma Marc Bloch (2016) a sociedade feudal europeia restringia-se, inicialmente, no núcleo de reinos latino-germânicos que emergiram entre a queda do império Romano e consolidação do império de Carlos Magno. Após o fim das incursões Magiares, Vikings e Árabes no continente a partir do século IX, consolidou-se a sociedade guerreira feudal baseada em laços de dependência mútua e na cavalaria juramentada.
A revitalização política e militar da cristandade lentamente levou a possibilidades de ampliação de seu escopo. Os escandinavos converteram-se à cruz, assim como os boêmios e polacos. A primeira cruzada fora convocada por Urbano II e Jerusalém conquistada, o que levou ao estabelecimento dos reinos cristãos no Levante árabe. O período da “Reconquista” na península ibérica se consolidava, conforme se insurgiam ante os califas e emires que reinaram após a conquista moura. Lentamente, o ideal cruzadístico começara a se aplicar além de sua intenta original, que se restringia à terras previamente cristãs agora sobre jugo muçulmano. Incluiu-se nesse âmbito a expansão do poder da igreja, e consequentemente a ampliação da sociedade feudal, para terras além. É nesse contexto que se insere as Cruzadas do Norte.
As Cruzadas no Norte foram únicas em relação às mais famosas instâncias destas campanhas no Oriente-Médio. Em primeiro plano, foi a continuação de um processo histórico que iniciou-se com as conquistas Carolíngias: a expansão e assentamento de povos germânicos ao leste do rio Elba, tornando mais pertinente após a falta de oportunidades de conquistas pelos reis escandinavos após o fim da era viking e a revitalização do poder do Sacro Império Romano Germânico com a dinastia Hohenstaufen (CHRISTIANSEN, 1980). Além disso, a natureza sociopolítica e cultural dos povos sendo invadidos era diferente. O Báltico era, de certa forma, a “última fronteira” da Europa, a única região onde ainda existia religiões, organizações políticas e culturas expressamente pagãos, não dissimilares aos povos que convergiram na porção ocidental do continente do contexto da queda de Roma.
A Primeira Cruzada do Norte, também conhecida como a Cruzada dos Vendos, ocorreu em 1147 sobre convocação do Papa Eugênio III como parte da Segunda Cruzada no Levante, convocada para retomar Jerusalém após sua subjugação pelas forças de Saladino. Essa extensão das campanhas foi direcionada contra os Vendos, um povo eslavo pagão que habitava territórios ao leste dos ducados fronteiriços do Sacro Império Romano. A motivação da convocação foi a necessidade de reinvigorar a expansão dos feudos germânicos ao leste, que havia perdido fogo nos conflitos internos das dinastias alemãs. Apesar de ter sido bem sucedida no ponto de vista militar e resultar em conversões forçadas de centros populacionais, no geral não teve sucesso em reviver o espírito expansionista previsto devido às intrigas políticas entre a nobreza alemã, polaca e dinamarquesa que participou do conflito (id.).
Uma nova e mais energética fase das Cruzadas do Norte iniciou-se em meados do século XII, mediante a criação de duas ordens militares que seriam instrumentais para a eventual conquista do Báltico para a igreja em Roma. A primeira e mais importante destas ordens militares foi a Ordem dos Irmãos da Casa Alemã de Santa Maria em Jerusalém, mais conhecida como a Ordem dos Cavaleiros Teutônicos, que foi fundada em 1190 em Acre na Terra Santa, composta quase exclusivamente por cavaleiros provindos na nobreza alemã que aventuraram-se com o imperador Frederico II em sua cruzada (NICOLLE, 2007). Com o declínio e eventual derrota dos reinos cristãos no oriente-médio, a ordem reajustou seu foco para o norte, onde receberia o patrocínio do Sacro Império Romano-Germânico.
A segunda destas foi a Ordem dos Irmãos da Espada da Livônia, fundada em 1198 com objetivo de converter os Letões, Estônios e Lituanos. Após convocação de uma nova cruzada pelo papa Inocêncio III, a Ordem da Espada lançou uma invasão da Estônia e Letônia, apoiados pelo rei Dinamarquês Valdemar II, o que resultou na conquista da maior parte dos respectivos territórios (CHRISTIANSEN, 1980). Em 1226 o duque Conrado de Masóvia convidou a Ordem dos Teutônicos para apoiar a sua conquista dos Prussianos, o que eventualmente se tornou a Cruzada Prussiana. A Ordem Teutônica eventualmente se tornou a força dominante no conflito, em especial devido à sua exímia cavalaria, e eventualmente tomariam a Prússia para si, fundando um poderoso estado feudal. Em 1237 a Ordem Teutônica absorveria a Ordem da Livônia como vassalos após a derrota dos mesmos na batalha de Saule. Estas conquistas aconteciam mediante intensa violência e conversão forçada das populações pagãs, cujos métodos primitivos de combate e descentralização política os botavam à mercê dos cavaleiros (NICOLLE, 2007). A única exceção a isso foram os Lituanos, que conseguiram adotar a organização política e militar dos invasores cristãos, o que possibilitou em sua contínua resistência à conversão.
A Ordem Teutônica começara a perder sua potência após a Batalha do Gelo em 1242 após sua derrota pelo príncipe russo Alexander Nevsky, na tentativa teutônica de converter os ortodoxos. O seu declínio se deu por conta de seu expansionismo, mesmo após a eventual conversão dos Lituanos em 1387, e abrangeu até mesmo embates contra reinos católicos como a Polônia. A partir de então, as cruzadas se tornaram menos motivadas pela ideia de expansão cristã, e tornou-se um campo de embate entre os já consolidados estados feudais no Báltico. A culminação desse processo foi a Batalha de Grunwald de 1410, onde a ordem foi derrotada pelas forças combinadas de Polacos e Lituanos, que agora eram ambas governadas por Vladislau II da Lituânia após seu casamento com a rainha Jadwiga da Polônia. A ordem eventualmente se secularizou, e seu grão-mestre Alberto de Brandenburgo se converteu ao luteranismo em 1525, o que levou a criação do Ducado da Prússia (CHRISTIANSEN, 1980).
Como pudemos perceber, as Cruzadas, de modo geral, foram uma tentativa de recuperar territórios e locais importantes para o cristianismo, bem como sua expansão, e manter posições de prestígio, além de ter sido oportuno para os comerciantes expandirem seus negócios (CARTWRIGHT, 2018). Nas campanhas do Norte o centro era a conversão de pagãos em cristãos, tornando-se também, uma grande conquista territorial. Perto de findar a era teutônica tornou-se uma disputa entre cristãos, ortodoxos e católicos, que após uma batalha entraram em acordo. No fim, as Cruzadas do Norte obtiveram resultado, grande parte dos territórios que estavam na área desta campanha atualmente são cristãos.
Referências:
BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal. São Paulo: Editora Edipro, 2016.
CARTWRIGHT, Mark. As Cruzadas do Norte. World History Encyclopedia. 2018. Disponível em: https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-17429/as-cruzadas-do-norte/ Acessado em: 03/08/2024.
CARTWRIGHT, Mark. As Cruzadas: causas e objetivos. World History Encyclopedia. 2018. Disponível em: https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-1249/as-cruzadas-causas-e-objetivos/ Acessado em: 03/08/2024.
CHRISTIANSEN, Eric. The Northern Crusades: the Baltic and the Catholic Frontier 1110-1525. London: The Macmillan Press, 1980.
NICOLLE, David. Teutonic Knight: 1190-1561. London: Osprey Publishing, 2007.
