Sthephanye dos Santos Caldeira – acadêmica do 4° semestre de Relações Internacionais da UNAMA

 A educação é uma força poderosa para a transformação social e política, fortificando direitos e valores democráticos. A Declaração Universal da Democracia (1997) ressalta uma conexão entre democracia e educação. Ela afirma que uma sociedade democrática deve se concentrar seus princípios na educação, enfatizando sua importância para a preservação do Estado democrático. Reconhecida como um direito humano fundamental em diversos documentos, como no artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) que inspirou também a Constituição Brasileira (1988), endossa que “todo ser humano tem direito à educação e alfabetização” em vista disso, garantir o exercício pleno da cidadania, logo uma participação ativa, consciente e livre na vida política. (ONU, 1948)

 A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) é uma agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU), criada em 1945, tem um papel crucial na promoção da educação como um alicerce para o exercício democrático, atuando em diversas áreas para garantir que a educação cívica chegue para todos as pessoas em um âmbito internacional.  Isso se reflete em suas políticas, programas e recomendações globais, como por exemplo, o relatório “Reimagining Our Futures Together: A New Social Contract for Education”, lançado em 2021 que destaca a necessidade de repensar a educação como um pilar para a justiça social e a sustentabilidade, que são imprescindíveis para o desenvolvimento da sociedade atual. Essa educação ajuda a formar cidadãos que não apenas compreendem seus direitos e deveres em sua própria nação, mas também os contextos mundiais que influenciam a política, a economia e a cultura. A UNESCO defende a Educação para a Cidadania Global (ECG) que incentiva o pensamento crítico, o respeito aos direitos humanos e engajamento nas decisões e processos democráticos, promovendo o diálogo, a paz e a justiça. (UNESCO, 2014)

Não se pode conceber a democracia sem a existência da educação política voltada para ela.  É inaceitável que ela seja firmada aos moldes do sistema capitalista e da agenda neoliberal, deve-se ir para além da educação capacitadora visando não apenas o mercado de trabalho, mas sim uma educação crítica, que prepare cidadãos capazes de gerar mudanças estruturais, voltada para a formação integral do ser humano. A educação nunca é neutra, sendo sempre um *ato político”, pois envolve a transformação da realidade e a capacitação dos indivíduos para questionarem e desafiarem as estruturas de poder e opressão presentes na sociedade. (FREIRE, 1987). Motivado por Paulo Freire, o MST acredita que a educação deve ser um processo de libertação. Em seus assentamentos, o movimento criou escolas que adotam um currículo crítico, onde os participantes aprendem sobre seus direitos, a história de lutas sociais e como se organizar politicamente. O MST considera a educação um componente essencial para fortalecer a cidadania e preparar os membros do movimento para participar ativamente nas lutas por reforma agrária e justiça social no Brasil (PIRES, 2012)

         A Teoria Crítica das Relações Internacionais é extremamente importante na compreensão da educação como exercício político democrático, que pode ser vista tanto como um meio de libertação quanto como um mecanismo de controle social. O conceito de hegemonia, desenvolvido por Antônio Gramsci, que complementa a visão de Freire ao discutir como as ideias dominantes são moldadas e disseminadas na sociedade.  Há o argumento que a hegemonia não é apenas uma imposição feita de forma direta, mas sim uma construção social onde as classes dominantes que conseguem que suas ideias sejam aceitas como “naturais” pela sociedade, sem questionamento da massa, isso se dá através do controle de instituições da sociedade como a educação, que pode ser utilizada como um instrumento de manutenção do status quo. Ele afirma que “a supremacia de um grupo social se manifesta de duas maneiras, como ‘domínio’ e como ‘direção intelectual e moral’. Um grupo social domina os grupos adversários que tende a ‘liquidar’ ou a submeter pela força armada, e dirige os grupos afins e aliados”. (GRAMSCI, 1978).

Através de uma abordagem crítica e libertadora, como a proposta por Paulo Freire e Antônio Gramsci é possível formar cidadãos capazes de desafiar a hegemonia e lutar por seus direitos. A educação deve ser um espaço de liberdade e reflexão, onde se cultiva a capacidade de pensar criticamente e agir de forma transformadora, rompendo com as estruturas de opressão e contribuindo para a construção de um futuro mais igualitário. Em suma, a educação é um instrumento poderoso tanto para a emancipação quanto para a manutenção da ordem social, dependendo de como é utilizada e abordada. Ela é, portanto, um elemento crucial na construção de uma sociedade democrática e justa (SEMERARO, 2007).

 Em síntese, quando a educação não promove o pensamento crítico e a reflexão, ela pode perpetuar a ideologia dominante e reforçar as relações de poder existentes. Nesse sentido, o plano de criar um indivíduo acrítico serve para justificar e perpetuar o capitalismo, criando uma sociedade que aceita desigualdades sem questionar. Em últimas análise, entende-se que há muitos desafios no acesso à educação que precisam ser superados, é necessário buscar uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade. Por meio de uma educação comprometida com esses valores, é possível formar indivíduos capazes de intervir de maneira autônoma e responsável nas diversas esferas da vida pública.

REFERÊNCIAS:

Democracia e educação: entre avanços e desafios. Disponível em: <https://www.jota.info/artigos/democracia-e-educacao-entre-avancos-e-desafios>.

Acesso em: 21 set. 2024.

‌FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 10. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

GRAMSCI, Antônio. Cadernos do cárcere. Volume II. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

MST. Princípios da Educação no MST. Caderno de formação n. 8. São Paulo, 1996

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948. Disponível em: https://www.un.org/en/about-us/universal-declaration-of-human-rights. Acesso em: 13 set. 2024.

PIRES, C. L. Paulo Freire e o MST: a Pedagogia do Oprimido no contexto da luta pela terra. Revista Espaço Acadêmico, v. 12, n. 135, p. 80-87, 9 jul. 2012. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/15587. Acesso em: 13 set. 2024.

SEMERARO, G. Da libertação à hegemonia: Freire e Gramsci no processo de democratização do Brasil. Revista de Sociologia e Política, n. 29, p. 95–104, 2007.

UNESCO. Educação para a Cidadania Global: preparando alunos para os desafios do século XXI. 2014. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/8pf0000227729. Acesso em: 13 set. 2024.

UNESCO. Reimagining our futures together: a new social contract for education. 2021. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379707. Acesso em: 13 set. 2024.