Maysa Lisboa, acadêmica do 6° semestre de Relações Internacionais

O Passaporte Musical dessa semana é sobre uma das Rainhas do Samba e integrante ilustre do ABC do Samba, Alcione. Cantora, compositora e multi-instrumentalista, Alcione é considerada uma figura ímpar no cenário musical brasileiro. Sua música, que representa as lutas afro-brasileiras e femininas, e seu impacto em debates globais sobre igualdade, direitos humanos e diplomacia cultural, contribuem para o uso da cultura como uma forma de influenciar e promover a imagem de uma nação no exterior. (ASSOBIAR, 2024)

Nascida em São Luís, Maranhão, em 21 de novembro de 1947, Alcione Dias Nazareth, conhecida como “A Marrom”, “Dama do Samba” e “A Voz do Samba”, começou a cantar aos 9 anos no programa Hora dos Calouros, da Rádio Difusora de São Luís e se destacou como cantora ao substituir o vocalista da Orquestra Jazz Guarani aos 17. Após se formar professora, foi demitida por tocar trompete em sala de aula, o que a levou a se mudar para o Rio de Janeiro em 1967, onde cantou em diversas boates (ASSOBIAR, 2024). Jair Rodrigues a indicou para Roberto Menescal, da gravadora Philips, o que levou ao lançamento de seu primeiro álbum, A Voz do Samba (1975). Esse disco, que incluiu o sucesso “Não Deixe o Samba Morrer”, abriu as portas para sua carreira. (ITAUCULTURAL, 2023)

Começou sua carreira musical nos anos 70 e se destacou com uma voz grave inconfundível e interpretações poderosas. Seu repertório inclui sambas, boleros e música romântica, e ela se tornou uma figura cultural de grande influência no Brasil e no mundo. Alcione lançou vários álbuns focados no samba e sua imagem também passou a se basear na sensualidade, refletida nas capas de seus discos (ITAUCULTURAL, 2024)

A partir do álbum Gostoso Veneno (1979), Alcione deu destaque a compositores da roda de samba Cacique de Ramos, como Zeca Pagodinho, Almir Guineto e Arlindo Cruz. Em Alerta Geral (1978), com a canção “Pode Esperar”, Alcione iniciou sua transição para o repertório romântico, com temas de ciúmes, traições e abandono, enquanto os arranjos instrumentais, antes centrados no samba, começaram a incorporar cordas e teclados.

Entre 1985 e 1987, ela lançou sucessos românticos como “Garoto Maroto” e “Meu Vício é Você”, ganhando destaque em temas de ciúmes, traições e paixões, consolidando-se nessa linha musical. A música “Estranha Loucura”, de 1987, reflete personagens femininas submissas, mas essa estética musical foi acompanhada por uma sensualidade crescente em sua imagem, destacada nas capas de seus discos nos anos 80. Nos anos 90, Alcione abraçou o pagode, colaborando com artistas como Só Pra Contrariar e Belo, e lançou o álbum Valeu (1997), homenageando a nova geração do samba. A partir dos anos 2000, suas letras passaram a acompanhar as reivindicações feministas, como em “Maria da Penha” (2007), que celebra a resistência das mulheres contra a violência. (ITAUCULTURAL, 2023)

Ela já se apresentou em mais de 30 países e gravou três compactos, 21 LPs, 19 CDs e nove DVDs (EBIOGRAFIA, 2019). Fundadora do Clube do Samba ao lado de Dona Ivone Lara, Martinho da Vila e Clara Nunes, Alcione também é uma grande entusiasta do Carnaval, tendo fundado a escola de samba mirim da Mangueira, onde é presidente de honra do Grêmio Recreativo Cultural Mangueira do Amanhã.

Em 2015, Alcione fez sua estreia no Rock in Rio, retornando ao festival em 2019 para se apresentar ao lado de IZA. Ao longo de sua carreira, ela conquistou 25 discos de ouro e sete de platina, além de várias honrarias, como a Ordem do Rio Branco, Medalhas Pedro Ernesto, Tiradentes, e Luiz Gonzaga, entre outras.

Ela também recebeu o Grammy Latino em 2003 como Melhor Álbum de Samba, além de prêmios da Academia Brasileira de Letras e honrarias internacionais, como o Diplôme de Médaille D’or, da França, e o título de “A Voz da América Latina”, concedido pela ONU. Alcione é considerada a madrinha do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro e embaixadora do turismo do Rio de Janeiro e Maranhão, reafirmando sua importância cultural no Brasil e no mundo (EBIOGRAFIA, 2019).

Analisando  sob  a perspectiva das Relações Internacionais, e pelo prisma do Soft Power, conceito popularizado por Joseph Nye, que se refere à capacidade de um país influenciar outros através de sua cultura, valores e políticas, ao invés do uso da força ou coerção, a carreira de Alcione ilustra perfeitamente esse conceito. A artista, com sua música, não apenas representa o Brasil, mas também exporta seus valores culturais.

Neste sentido, ao se apresentar e gravar discos em diversos idiomas e países, além de colaborar com artistas internacionais, ela atua como um canal de difusão cultural, ampliando o alcance do samba e da música brasileira e contribuindo para o prestígio global do Brasil. Portanto, Alcione se torna um exemplo vivo de como a cultura e a arte podem servir como ferramentas de projeção internacional de poder.

Além disso, também revela características da teoria de Cynthia Enloe, que adota uma perspectiva feminista. Ela destaca a importância de figuras culturais e simbólicas que, através de sua música, abordam questões de gênero e feminismo. A partir dos anos 2000, suas letras começaram a refletir a luta das mulheres por empoderamento, como evidenciado em canções como “Loba” (2001), “Mulher Ideal” (2005) e “Você Me Vira a Cabeça” (2002). Assim, Alcione emerge não apenas como uma embaixadora cultural, mas também como uma voz poderosa na promoção de questões de gênero, demonstrando como o talento artístico pode transcender fronteiras e gerar impacto significativo em múltiplas esferas

REFERÊNCIAS

FERREIRA, I. Alcione: Cantora, compositora e multi-instrumentista. Portal Assobiar. [s.d]. Disponível em: <https://portalassobiar.com.br/dias-mulheres-virao/alcione-cantora-compositora-e-multi-instrumentista/> . Acesso em: 10 set. 2024.

FUKS, R. Alcione. Ebiografia. [s.d]. Disponível em: <https://www.ebiografia.com/alcione/> . Acesso em: 10 set. 2024.

ITAU CULTURAL. Alcione. 2023. Disponível em: <https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa643451/alcione> . Acesso em: 10 set. 2024.

ITAÚ CULTURAL. Alcione: 75 anos de uma voz vitoriosa. Disponível em: https://www.itaucultural.org.br/secoes/playlists/alcione-75-anos-de-uma-voz-vitoriosa. Acesso em: 10 set. 2024.

BOHORQUEZ, T. Soft Power – The Means to Success in World Politics. UCLA – Asia Pacific Center. 2005. Disponível em: <https://www.international.ucla.edu/asia/article/34734> . Acesso em: 05 set. 2024.