Victtor Calderaro (Acadêmico do 6º semestre de Relações Internacionais na UNAMA)

A concepção da Organização das Nações Unidas (ONU), após o trauma das duas grandes guerras, trouxe consigo a esperança de um organismo eficaz na mediação de conflitos e que utilizaria seu poder constituído para a conservação diplomática da paz entre os estados membros, mesmo diante da característica anárquica do Sistema Internacional (SI). Contudo, a escalada nas tenções geopolíticas no Oriente Médio e a continuidade da guerra no Norte da Europa demonstram um problema que circunda diretamente a atuação e a influência das Nações Unidas, no que concerne ao uso impositivo da força para frear avanço de crimes contra a humanidade nos conflitos modernos.

Inicialmente, a Carta das Nações Unidas (1945) definia, em seu artigo 23, que o Conselho de Segurança (CS) seria composto de quinze membros das Nações Unidas. Sendo que a República da China, a França, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, e os Estados Unidos da América seriam membros permanentes do Conselho. Apesar de tudo, é perceptível que sua estrutura atual, passados quase 80 anos de sua criação, ainda reflete anatomicamente a ordem internacional instituída no período do Pós-Segunda Guerra Mundial, onde os interesses das potências dominantes se sobrepõem aos benefícios humanos de uma paz duradoura.

Um forte sintoma dessa disfuncionalidade é a impossibilidade de uma ação enérgica em determinados conflitos, que advém das divergências político-ideológicas que existem entre os cinco membros permanentes com poder de veto, o que torna a criação de novas resoluções um processo lento, de difícil aprovação e que, na maioria das vezes, é vetado de maneira unilateral. De modo geral: “Os frequentes embates entre os membros do Conselho de Segurança têm forte conotação política e evidenciam a polarização entre EUA e Rússia. Expõem também a necessidade de reforma do órgão, sobretudo no que diz respeito à representatividade e ao poder de veto” (COHEN, 2023).

Para o teórico Kenneth Waltz (1959), a competição entre os Estados no SI é explicada pela busca de um Equilíbrio Poder. No entanto, Waltz descreve como Bandwagoning o ato estratégico de potências menores se alinharem a superpotências, com o objetivo de fortalecimento conjunto e de defesa mútua (WALTZ, 1979). Nessa situação, o antagonismo ideológico entre os Estados Unidos e a Rússia, por exemplo, arrastam os demais membros permanentes do CS a votarem em favor dos interesses de sua potência dominante, assim como agem os vagões que, em viagem, seguem sendo arrastados por uma forte locomotiva.

Um dos países que advogam em favor da reforma do Conselho de Segurança é o Brasil, que desde a década de 1990 tem indicado sua pretensão em se tornar um membro permanente. “O Governo brasileiro tem deixado claro seu interesse em assumir as responsabilidades inerentes à participação como membro permanente nos trabalhos de um Conselho de Segurança ampliado, como representante da América Latina e do Caribe” (AMORIM, 1996).

Por outro lado, a teoria crítica de Robert Cox (1981) introduz o argumento de que as estruturas de instituições como a ONU foram, deliberadamente, arquitetadas para que pudessem favorecer as potências dominantes a perpetuarem suas estruturas de poder. Na visão de Cox, as estruturas globais delimitam a atuação de organismos como as Nações Unidas, mas sua atuação obedece a uma ordem mundial elitista, que hierarquiza os Estados e impede a reforma das instituições internacionais por meio de seu poder, por esse motivo, a possibilidade de reforma do CS ainda permanece remota.

Por fim, mesmo diante das urgências humanitárias – que incluem os conflitos e as guerras em curso na África Central, no Oriente Médio e no Norte da Europa – a influência das grandes potências, a complexidade do fator beligerante e a dificuldade no cumprimento das resoluções (enforcement) no CS, são alguns fatores que inviabilizam a resolução pacífica dos conflitos e a atuação efetiva das Nações Unidas. Portanto, a reforma do Conselho de Segurança é uma necessidade urgente, diante da incapacidade decisória dos atuais membros permanentes, para que assim o mundo consiga vislumbrar um futuro em que a preservação da paz e da dignidade humana sejam efetivamente respeitadas, em detrimento dos interesses obscuros de dominação das grandes potências.

Referências Bibliográficas

AMORIM, Celso. A reforma da ONU. Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 1996.

CARTA das Nações Unidas. Organização das Nações Unidas, São Francisco, 26 jun. 1945. Disponível em: <https://brasil.un.org/sites/default/files/2022-05/Carta-ONU.pdf> Acesso em: 12 abr. 2024.

COHEN, Sandra. Vetos sucessivos no Conselho de Segurança expõem inação da ONU e necessidade de reforma. Portal G1, 27 out. 2023. Disponível em: < https://g1.globo.com/mundo/blog/sandra-cohen/post/2023/10/27/vetos-sucessivos-no-conselho-de-seguranca-expoem-inacao-da-onu-e-necessidade-de-reforma.ghtml> Acesso em: Acesso em: 12 abr. 2024.

COX, Robert W. et al. Forças sociais, Estados e ordens mundiais: além da teoria de Relações Internacionais. OIKOS (Rio de Janeiro), v. 20, n. 2, 2021.

WALTZ, Kenneth. Man, the state and war. Columbia University Press, 1959. 
WALTZ, Kenneth Neal. Theory of international politics. Boston: McGraw, 1979.