Nina Roberta Fernandes da Silva – Acadêmica do 4º semestre de Relações Internacionais

A colonialidade é um conceito que possuí inúmeras interpretações, sendo assim, a interpretação que será destrinchada é a vertente que lê o termo como reflexão do lado constitutivo da modernidade, lendo a mesma como colonial. A expansão marítima mercantilista iniciada em meados de 1492, que conta com a participação de Portugal e Espanha, foi espaço\tempo para a constituição e difusão da racionalidade moderna e eurocêntrica, ou seja, a modernidade (Dussel, 1994). A invasão da América Latina resultou na implantação de uma nova ordem de poder de um povo que se considerava soberano, os europeus, sobre os povos que foram inferiorizados, os indígenas e os negros, onde houve implementação forçada de conceitos e crenças como a heterossexualidade, cristianismo e a língua dos colonizadores.

Ainda mais, se é válido salientar que anteriormente a chegada daqueles que viriam a ser os colonizadores, as civilizações que foram dominadas possuíam seus próprios sistemas de funcionamento de sociedade (Como, 2023), todavia, o sistema de dominação imposto pela colonização de países europeus reverberou inúmeras consequências, algumas sendo passíveis de localização no contexto contemporâneo.

Ao utilizar a Teoria Decolonial como lente de estudo, pensamentos como de Aníbal Quijano e de María Lugones se tornam elementos chaves para poder haver uma leitura em relação a questão da colonialidade na realidade das mulheres, em específico para mulheres latino-americanas.

Nesse sentido, a colonialidade do poder, tema pensado inicialmente pelo intelectual peruano Aníbal Quijano (2005), é uma escolha de leitura para reflexões sobre o delinear de relações entre Desenvolvimento e Gênero, visto que existe correlação com continuidades de um passado colonial que impactaram diretamente no empobrecimento de países periféricos, tanto na questão econômica quanto na questão social.

Ademais, o paralelo torna-se possível devido ao fato que as relações de dominação e submissão envolvendo os países subdesenvolvidos e o sistema capitalista se refletem de maneira semelhante nas questões em torno de raças, etnias, culturas e gênero, havendo o processo de diminuição do que são considerados inferiores para aqueles que já detêm de determinada vantagem em seus devidos contextos.

Também na concepção de colonialidade, partindo do trabalho executado por Quijano, a filósofa María Lugones (2008) tece a reflexão de raça e gênero e propõe que o conceito de colonialidade de gênero. Em síntese, para a autora, houve um apagamento do papel dos homens no processo de dominação não somente de corpos negros e indígenas, mas também de mulheres, o que reflete o uso colonial de gênero que não avançou para outras categorias de gênero sem ser a pré-definida, que são a heterossexualidade e o patriarcal.

Por isso se encontra na realidade de mulheres latino-americanas, inúmeras foram as consequências produzidas pela colonialidade, sendo uma delas a violência de gênero. Dessa maneira pode se observar uma dupla violação, onde na primeira, que se trata da visão masculina, existe a questão do machismo estrutural, que por vezes evolui para pensamento de dominador e dominado que comina em relações abusivas entre homens e mulheres. (Cortez, 2020).

Além disso, na outra visão, se encontra visão feminina norte-americana, pois essa excluiu e apagou mulheres latino-americanas, mulheres negras e mulheres periféricas de sua luta.

Para trabalhar contra os efeitos danosos produzidos pela colonialidade e contra as violências que sofria de duas classes diferentes, as mulheres latino-americanas desenvolvem o Feminismo Latino-americano Descolonial. Dessa forma o movimento surge dos sofrimentos das mulheres da América Latina, essas que historicamente eram lidas como incapazes de produzirem pensamentos referente a suas vivências em seus próprios territórios. Na base do movimento se encontra a das classes mais violentadas e subalternizadas pelo movimento feminista, norte-americano, as mulheres latino-americanas, mulheres negras e periféricas. (Sartore, Santos e Silva, 2016).

Outrossim, segundo Espinosa Miñoso (et al. 2013) o Feminismo Latino-americano Descolonial se trata de uma transformação radical das relações sociais de poder que oprimem e subordinam as mulheres indígenas, afro e mestiças pobres que residem na América Latina. E, por isso, o Feminismo Latino-americano Descolonial possui em seu cerne de funcionamento rupturas profundas com o Feminismo Hegemônico.

Em suma, se observa que a perspectiva decolonial trabalha para um rompimento com as linhas de pensamentos eurocentradas. Essa ideia se baseia na inferioridade de uma parcela, um conhecimento ocidentalizado e antropocêntrico que apagam e desumanizam pessoas de acordo com a vontade do sistema capitalista. O Feminismo Latino-americano Descolonial reconhece que o desenvolvimento não se baseia somente em diminuir a pobreza, mas sim também na efetiva diminuição de diferenças entre homens e mulheres.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COMO realmente era a América antes da chegada de Colombo?. BBC News Brasil, 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/resources/idt-36af0f00-a464-4e05-8abc-0af6f62c5e3f. Acesso em: 15 nov. 2024.

CORTEZ, Lilian. Os feminismos latino-americanos sob uma perspectiva decolonial, interseccional e transnacional. Tese (Especialista em Mídia, Informação e Cultura) – Centro de Estudos Latino-Americanos Sobre Cultura e Comunicação, Universidade de São Paulo.

DUSSEL, Enrique. 1492: El Encubrimiento del Otro: hacia el origen del “mito dela modernidad’’. Plural Editores. La Paz, 1994.

ESPINOSA, Miñoso, Yuderkys;Gomez, Diana; Lugones, María; Ochoa, Karina. Reflexiones Pedagógicas en torno al Feminismo Descolonial: una conversa en cuatros voces. En WALSH, Catherine. (Org.). Pedagogías Decoloniales: prácticas insurgentes de resistir, (re)existir y (re)vivir. Serie Pensamiento decolonial. Quito-Ecuador: Ediciones Abya-Yala, 2013.

LUGONES, María. Colonialidad y género. Tabula Rasa. Bogotá – Colômbia, N° 9, 75-101, jul./dez., 2008.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. CLACSO, 2005. Disponível em: https://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/sur-sur/20100624103322/12_Quijano.pdf. Acesso em: 13 nov. 2024.

SARTORE, Anna Rita; SANTOS, Aline Renata Dos; SILVA, Camila Ferreira Da. Tecendo Fios Entre o Feminismo Latino-Americano Descolonial e os Estudos Pós-Coloniais Latino- Americanos. Interritórios, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.33052/inter.v1i1.5011. Acesso em: 15 nov. 2024.