
Alciane Carvalho Dias
6º semestre de Relações Internacionais
Tupac Amaru Shakur, nascido em 1971, foi mais do que um rapper; ele se tornou um símbolo de resistência e luta por justiça social. Seu nome, inspirado em Tupac Amaru II, líder indígena peruano que liderou uma revolta contra a colonização espanhola no século XVIII, já indicava sua conexão com uma tradição de resistência ao colonialismo. Essa escolha, feita por sua mãe, Afeni Shakur, uma ativista dos Panteras Negras, reflete o contexto político e cultural em que Tupac foi criado e conecta sua identidade pessoal à luta histórica contra a opressão. No âmbito da teoria pós-colonial, essa referência simbólica reforça a ideia de que a cultura e a identidade desempenham papéis centrais na resistência ao imperialismo, como afirmado por Edward Said (1995).
Os Panteras Negras foi um movimento revolucionário negro, fundado nos Estados Unidos em 1966, que defendia a autossuficiência das comunidades negras, o fim da brutalidade policial e a igualdade racial por meio de ações políticas, sociais e culturais (CLEAVER, 1970). Afeni Shakur, mãe de Tupac, era uma importante integrante desse movimento, tendo sido perseguida e encarcerada pelo governo norte-americano devido à sua militância. Esse ambiente político e combativo influenciou profundamente a formação do artista, tanto em sua percepção crítica das estruturas de poder quanto em seu compromisso com a justiça social. Crescer em meio às discussões ideológicas e ações diretas dos Panteras Negras deu a Tupac a base para sua capacidade de articular, em suas músicas, os anseios e as lutas de comunidades marginalizadas.
De acordo com a teoria construtivista, as relações internacionais são moldadas por normas, ideias e identidades sociais, mais do que apenas pela estrutura material do poder (WENDT, 1999). O rapper exemplifica essa perspectiva ao usar sua música como uma plataforma para contestar narrativas dominantes que marginalizam comunidades negras e pobres. Álbuns como Me Against the World (1995) e All Eyez on Me (1996) articulam experiências de exclusão social, violência sistêmica e resistência cultural, desafiando as estruturas hegemônicas que perpetuam a desigualdade racial e econômica. A faixa “Dear Mama”, por exemplo, não apenas celebra a força das mulheres negras, mas também denuncia o impacto das políticas de encarceramento em massa sobre famílias afro-americanas, ecoando críticas construtivistas ao papel das normas sociais na reprodução do status quo.
Além disso, a teoria pós-colonial, com autores como Edward Said (1995) e Frantz Fanon (2008), oferece ferramentas valiosas para compreender como Tupac representou a resistência ao legado colonial em contextos urbanos. A obra do músico pode ser vista como uma forma de “contra-narrativa”, um conceito central na teoria pós-colonial, onde ele reconfigura o discurso sobre a identidade negra, celebrando suas raízes africanas e sua luta contra o imperialismo cultural. A escolha do nome “Tupac Amaru” simboliza essa conexão histórica com a resistência ao colonialismo, evidenciando como seu legado vai além da música para abraçar um discurso de emancipação global.
Outro aspecto relevante é a utilização de sua arte como um meio de construir solidariedades transnacionais, alinhando-se à ideia pós-colonial de que a cultura pode servir como um espaço de resistência global. No videoclipe de “Changes”, Tupac explora questões universais de justiça social, conectando as lutas de comunidades marginalizadas nos Estados Unidos com processos globais de exclusão. Sua crítica ao capitalismo neoliberal e à brutalidade policial revela afinidade com as análises pós-coloniais, que vinculam as dinâmicas locais de opressão a estruturas globais de poder.
O construtivismo e o pós-colonialismo também nos ajudam a compreender como a morte do rapper em 1996 foi não apenas um evento trágico, mas um ponto de ruptura que revelou a vulnerabilidade de narrativas de resistência frente à violência estrutural. Sua morte simboliza, segundo Said (1995), o silenciamento contínuo das vozes que desafiam o imperialismo cultural, um tema central na teoria pós-colonial.
Portanto, a vida e obra de Tupac Shakur exemplificam como as identidades culturais e as narrativas desempenham papéis cruciais na contestação e na reformulação das estruturas de poder. Ao abordar questões de opressão e resistência por meio de sua música, Tupac não apenas representou a realidade das comunidades marginalizadas, mas também desafiou o sistema internacional, promovendo novas formas de pensar sobre justiça, igualdade e solidariedade. Sua relevância transcende as fronteiras do hip-hop, posicionando-o como uma figura central na interseção entre cultura e política global.
Referências
CLEAVER, Eldridge. Soul on ice. Nova York: Dell Publishing, 1970.
FANON, Frantz. Os condenados da Terra. São Paulo: Editora Brasiliense, 2008.
SAID, Edward W. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
WENDT, Alexander. Social theory of international politics. Cambridge: Cambridge University Press, 1999.
SHAPIRO, Michael J. Violence and the political imaginary. Nova York: Routledge, 2000.
