
Carla Gomes de Lima – 4° semestre de Relações Internacionais da Unama.
Em 6 de dezembro de 2024, foi anunciada a conclusão das negociações do Acordo de Parceria entre o Mercosul e a UE. Encerrando um processo negociador que vinha desde 1999, onde ambos os blocos trabalhavam para a construção de um acordo de livre comércio. Vista como uma das políticas comerciais internacionais mais ambiciosas e polêmicas, o Acordo de Livre Comércio (ALC) pretende eliminar barreiras tarifárias e aumentar o comércio entre os países membros da União Europeia e do Mercosul. Embora existam impactos positivos sejam esperados, como o crescimento de exportações e a criação de novos mercados e empregos, a questão central, especialmente para agricultores franceses, é o impacto econômico, ambiental e social do Acordo. (CNN, 2024)
O ALC abre uma série de oportunidades para empresas da União Europeia, especialmente nos setores industriais e tecnológicos. E com isso, o potencial de fortalecer a competitividade dessas empresas, permitindo-lhes explorar mercados emergentes com grande crescimento. Ademais, a União Europeia poderá beneficiar-se do acesso facilitado a importantes setores do Mercosul, como o agronegócio e os recursos naturais, garantindo a UE o fornecimento de bens essenciais, como carne, soja e etanol, de países com menores custos de produção. (EURONEWS, 2024)
Além dos aspectos comerciais, o acordo também representa uma chance de aliança entre os dois blocos em um cenário de crescente protecionismo global, consolidando o Mercosul como um parceiro estratégico, que se alinharia aos valores europeus de sustentabilidade e comércio justo. Entretanto, os trabalhadores do setor agrícola europeu questionam tais afirmações, visto que, os benefícios do acordo são direcionados apenas a setores industriais e comerciais, esquecendo o papel econômico e cultural significativo da agricultura. (CNN, 2024)
As problemáticas apontadas pelos agricultores franceses mostram certa preocupação frente a possibilidade de uma concorrência desleal que poderá surgir com a abertura do mercado europeu para os produtos agrícolas do Mercosul, visto que, o Brasil, por exemplo, poderá exportar grandes volumes de carne para a União Europeia a preços significativamente mais baixos, – que são possíveis através de normas ambientais e de segurança alimentar que são menos rigorosas nos países do Mercosul em relação das exigidas na União Europeia – e assim, reduzindo lucros de agricultores locais. (Relações Exteriores, 2024)
O receio de que essa liberalização prejudique a atividade da agricultura local não se dá somente no âmbito econômico. Trabalhadores franceses, que lidam com a legislação sistemática da França em termos de bem-estar animal e controle de práticas agrícolas, enxergam a entrada de produtos de países como o Brasil como uma ameaça não apenas à economia, mas também aos padrões éticos que guiam a produção rural do país. Protestos de agricultores e o anúncio do CEO da rede Carrefour sobre boicotes que seriam adotados contra a exportação de carne do Mercosul foram medidas tomadas como forma de manifestar solidariedade ao setor agrícola francês. (EXAME, 2024)
Nesse viés, o chamado realismo econômico, uma vertente do Realismo nas Relações Internacionais, que defende que os países priorizam seus interesses econômicos, focando na relação mútua entre segurança e prosperidade interna ao elaborar políticas comerciais. Desse modo, se faz pertinente analisar a atual situação. (Internacional da Amazônia, 2019)
Robert Gilpin, teórico neorrealista e expoente do realismo econômico, argumenta que a ordem internacional é influenciada pelas condições econômicas globais, e pela distribuição de poder entre os países. Nesse sentido, a pressão dos agricultores franceses pode ser vista como uma forma de tentar proteger esse setor em um sistema econômico global mais competitivo. A disputa externa que pode ser causada pelo ALC, coloca os interesses da França e do sindicato agrícola francês contra os de países com modelos agrícolas mais baratos e menos regulamentados, criando um conflito entre fortalecer a economia interna e as exigências de um mercado global mais liberalizado. (Internacional da Amazonia, 2019)
A pressão dos agricultores franceses que temem a liberalização comercial e seus efeitos negativos sobre a competitividade de suas produções agrícolas e os padrões ambientais e de qualidade adotados pela UE, é legítima e retrata um dilema amplo entre o comércio global e as normas agrícolas locais. Para que o Acordo seja bem-sucedido, é essencial que a União Europeia assegure mecanismos de proteção adequados que promovam integração equilibrada, que leve em consideração não apenas os benefícios econômicos, mas também os impactos sociais e ambientais, bem como as problemáticas apontadas pelo sindicato francês.
REFERÊNCIAS
MERCOSUL e União Europeia anunciam acordo histórico de livre comércio.CNN Brasil, 2024.Disponível em:<https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/mercosul-e-uniao-europeia-anunciam-acordo-historico-de-livre-comercio/?utm_source=whatsapp&utm_medium=whatsapp-link&utm_content=canal.>Acesso em: 07 de dezembro de 2024.
NAKAMURA, João. Acordo Mercosul-EU traz alívio em meio a guinada protecionista, dizem especialistas. CNN Brasil, 2024. Disponivel em: Disponivel em:<https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/acordo-mercosul-ue-traz-alivio-em-meio-guinada-protecionista-dizem-especialistas/> Acesso em: 07 de dezembro de 2024.
ALVAREZ, Isabel. Diário de Pernambuco. Agricultores protestam em frente ao Parlamento Europeu contra acordo com o Mercosul. Diário de Pernambuco, 2024. Disponível em: https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/mundo/2024/11/agricultores-protestam-em-frente-ao-parlamento-europeu-contra-acordo.html. Acesso em: 08 de dezembro de 2024.
KATANICH,Doloresz. Acordo comercial EU-Mercosul: Quem ganha e quem perde. EURONEWS, 2024. Disponível em: https://pt.euronews.com/business/2024/11/19/acordo-comercial-ue-mercosul-quem-ganha-e-quem-perde-na-europa. Acesso em: 08 de dezembro de 2024.
CARREFOUR da França e carne do Mercosul: entenda o que está por trás do boicote. Exame, 2024. Disponível em: https://exame.com/agro/carrefour-da-franca-e-carne-do-mercosul-entenda-o-que-esta-por-tras-do-boicote/. Acesso em: 10 de dezembro de 2024.
FREITAS, Gabriela. A política internacional de Robert Gilpin.Internacional da Amazônia, 2019. Disponível em: https://internacionaldaamazonia.com/2019/07/04/a-politica-internacional-de-robert-gilpin/. Acesso em: 10 de dezembro de 2024.
BUENO, Guilherme.Acordo EU-Mercosul: Oportunidade ou desafios Intransponíveis?.Relações Exteriores, 2024. Disponível em: https://relacoesexteriores.com.br/acordo-ue-mercosul-oportunidade-ou-desafios-intransponiveis/Acesso em: 08 de dezembro de 2024.
