
Por Manuelle Catunda Gaia, acadêmica do 7º semestre de Relações Internacionais na Unama.
No primeiro dia de 2025, nove países — Bielorrússia, Bolívia, Indonésia, Cazaquistão, Tailândia, Cuba, Uganda, Malásia e Uzbequistão — tornaram-se oficialmente parceiros do BRICS (Global Times, 2025). A incorporação de um país como Cuba, que ocupa uma posição estratégica tanto nas dinâmicas latino-americanas quanto nas caribenhas, reflete o atual movimento do grupo BRICS por uma arena internacional mais justa e multipolar a partir de uma melhor cooperação entre o Sul Global.
É possível entender as novas dinâmicas entre Norte e Sul Global a partir da análise Sistema-Mundo de Immanuel Wallerstein, importante sociólogo e historiador para o debate neomarxista das relações internacionais, onde o sistema internacional é dividido em centro, semiperiferia e periferia, sendo capaz de apresentar fluidez entre eles (Wallerstein, 1976). Segundo Wallerstein, por conta da capacidade do capitalismo de tornar possível a expansão econômica constante do sistema-mundo, embora apresentando uma distribuição muito distorcida de suas recompensas (1976). É justamente por essa distribuição distorcida que o grupo BRICS está propondo novas formas de inserção internacional que não passam pelos mecanismos desenhados pelo Norte, afirma a pesquisadora do Centro de Pesquisa de Políticas Internacionais de Cuba, Lourdes Regueiro, em entrevista ao site de notícias Brasil de Fato (Lopes, 2024).
Cuba é o lugar onde o BRICS pode mostrar ao mundo seu potencial e começar a desmantelar a ordem internacional baseada em sanções (Pietrobon, 2023). Apesar de não ser o único país no cerco do BRICS sob sanções, a história geopolítica da ilha a leva a estar sob o bloqueio econômico, comercial e financeiro mais longevo da história; aplicado, fortalecido e mantido pelo governo dos Estados Unidos, democrático ou republicano, a quase 65 anos. Em apenas um ano, o anterior governo dos EUA sancionou 53 navios e 27 empresas associadas a embarques para Cuba (Rodríguez, 2024). Em discurso anual à Assembleia Geral da ONU, Bruno Rodríguez, ministro das Relações Exteriores de Cuba, exemplifica: “os EUA sabem perfeitamente que violam a Carta das Nações Unidas e o Direito Internacional […]. 15 minutos de bloqueio, menos do que levará este discurso, equivalem a 144 mil dólares de perdas para Cuba” (Rodríguez, 2024).
Por questões como essas, discussões sobre uma possível desdolarização surgem como alternativas para enfrentar o estrangulamento econômico causado por essas sanções. Nesse contexto, a diversificação promovida pelo grupo fundador do BRICS pode oferecer maior autonomia aos países do Sul, ampliando sua capacidade de negociação (Lopes, 2024). Para Cuba, os desafios para um maior desenvolvimento econômico são ainda mais complexos, dado seu status de um dos poucos países que “realmente podem perturbar o sono dos Estados Unidos”, afirma o analista geopolítico Emanuel Pietrobon (2023). Visto que o embargo não foi lançado apenas para provocar uma mudança de regime, mas também para impedir que esse Estado insular fosse economicamente bem-sucedido. O primeiro objetivo foi perdido, mas o segundo foi um golpe direto (Pietrobon, 2023).
Diversos especialistas destacam que a incorporação de Cuba ao grupo abre a oportunidade para que a ilha participe de seus variados mecanismos de cooperação, ampliando suas possibilidades de integração internacional. Havana vê em seus principais objetivos combater medidas restritivas unilaterais dos EUA e buscar fontes alternativas de financiamento (Vorotnikova, 2024). O acesso ao Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS se apresenta como uma excepcional janela de oportunidades para que Cuba seja capaz de sair da posição de periferia de Wallerstein, a qual é injustamente imposta. Esse financiamento é crucial para que Cuba dê continuidade ao desenvolvimento de seu parque industrial, possibilitando a modernização de sua infraestrutura produtiva e a inserção em cadeias globais de valor. Como apontado, “Cuba tem recursos suficientes para se juntar às cadeias de suprimento de minerais mais importantes do mundo” (Pietrobon, 2023), o que reforça o potencial da ilha em contribuir de forma estratégica para os países do BRICS.
Além disso, conforme destacado pelo ministro Bruno Rodríguez na 16ª Cúpula do BRICS realizada em Kazan no ano passado, Cuba, conhecida como a Chave do Golfo por sua posição estratégica no Mar do Caribe, tem o potencial de facilitar o acesso a importantes mercados da América Latina e do Caribe (Rodríguez, 2024). Essa posição permite à ilha estabelecer parcerias estratégicas que beneficiem tanto os países membros quanto os parceiros do BRICS, alinhando-se aos planos do grupo para promover maior integração e cooperação no Sul Global. Portanto, a superação do isolamento forçado de Cuba pode significar a culminação de um sistema emergente mais equitativo, sustentável e multipolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
DESTACAN vínculos de Cuba con los BRICS pese a presiones de EEUU. Prensa Latina, 2025. Disponível em: https://www.prensa-latina.cu/2025/01/03/destacan-vinculos-de-cuba-con-los-brics-pese-a-presiones-de-eeuu/. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
LOPES, Gabriel. Como uma eventual desdolarização do BRICS representa oportunidades para Cuba. Brasil de Fato, 2024. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2024/07/05/como-uma-eventual-desdolarizacao-do-brics-representa-oportunidades-para-cuba. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
NINE countries officially join BRICS. Global Times, 2025. Disponível em: https://www.globaltimes.cn/page/202501/1326196.shtml. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
PIETROBON, Emanuel. The strategic importance of Cuba. Valdai Club, 2023. Disponível em: https://valdaiclub.com/a/highlights/the-strategic-importance-of-cuba/. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
RODRÍGUEZ, Bruno. Discurso del ministro de Relaciones Exteriores de la República de Cuba, Bruno Rodríguez Parrilla, en la presentación del proyecto de Resolución A/79/L.6, titulado “Necesidad de poner fin al bloqueo económico, comercial y financiero impuesto por los Estados Unidos de América contra Cuba”. Ministerio de Relaciones Exteriores de Cuba, 2024. Disponível em: https://cubaminrex.cu/es/discurso-del-canciller-de-cuba-bruno-rodriguez-parrilla-en-la-presentacion-del-proyecto-de . Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
RODRÍGUEZ, Bruno. Due to its strategic position, Cuba can facilitate BRICS access to important markets in LAC and beyond. Ministerio de Relaciones Exteriores de Cuba, 2024. Disponível em: https://misiones.cubaminrex.cu/en/articulo/due-its-strategic-position-cuba-can-facilitate-brics-access-important-markets-lac-and. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.
VOROTNIKOVA, Tatiana. Latin American prospects for BRICS. Russian Council, 2024. Disponível em: https://russiancouncil.ru/en/analytics-and-comments/analytics/latin-american-prospects-for-brics/. Acesso em: 6 de janeiro de 2025.WALLERSTEIN, Immanuel. O Sistema-Mundo Moderno: Agricultura Capitalista e as Origens da Economia-Mundo Europeia no Século XVI. Nova Iorque: Academic Press, 1976. Disponível em: https://www.csub.edu/~gsantos/WORLDSYS.HTML. Acesso em: 8 de janeiro de 2025.

como pode essa manuelle gaia ser tão talentosa?? arrasouuuuuuuu
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