Antônio Vieira, acadêmico do 3° semestre de Relações Internacionais

Ficha Técnica

Gênero: Ficção

Edição: Companhia das Letras (1997)

Páginas: 96

Ano: 1915

Autor: Franz Kafka

País de origem: República Tcheca

No início do século XX, o prestigiado escritor tcheco Franz Kafka escreveu A Metamorfose, obra que, devido à sua narrativa complexa e atemporal, se torna o seu livro mais famoso. O texto descreve parte da vida de Gregor Samsa, um jovem que se esforça para dar uma ótima qualidade de vida à sua família através de seu trabalho. No entanto, tudo muda quando, inesperadamente, ele vê o seu corpo transformado no que parece ser um inseto gigante.

Dessa forma, no decorrer da obra é exposta a angústia dele por ter que trabalhar como caixeiro-viajante, profissão na qual ele é responsável por representar uma firma em suas vendas entre as cidades. É descrito como ele não se sente realizado, considerando sua ocupação estressante por diversos motivos, entre eles estão a preocupação com a troca de trens, as refeições irregulares, e a falta de descanso. Contudo, mesmo não gostando do emprego ele precisa suportá-lo, para que, além de manter as finanças rotineiras da casa, possa pagar a dívida que seu pai deve ao seu gerente.

Boa parte da história se passa no apartamento da família Samsa, mais especificamente no quarto de Gregor, que por si só é um personagem, haja vista o nível de descrição e importância que Franz Kafka lhe dá. Certo dia, quando ele acorda em um corpo estranho no seu quarto, suas preocupações habituais se tornam mais intensas ao perceber que havia se atrasado para o trabalho. Além disso, sua nova aparência veio junto com uma dor física e seus sentidos humanos, como a fala, parecem afetados. Isso o leva a questionar sobre qual seria a reação dos parentes ao vê-lo dessa forma e o seu futuro na firma.

O cenário que se segue é tenso, com o seu gerente indo até o seu apartamento questioná-lo sobre o atraso – nunca havia se atrasado – desse modo forçando Gregor a se expor. Há um trecho que exemplifica bem o peso que o protagonista sofre quando a mãe diz ao gerente que seu filho deve apenas não estar se sentindo bem. Ele replica, afirmando que os homens do comércio, para manter a ordem dos negócios, devem superar um ligeiro mal-estar (Pág. 18).

Conforme o texto avança, o leitor acompanha o impacto que a metamorfose tem sobre o estado físico e mental de Gregor, à medida que ele começa assimilar mais os hábitos de um inseto – como rastejar pelas paredes e se acostumar com a sujeira do quarto–, e a se sentir triste pelo distanciamento dos familiares. Naturalmente, isso gera uma mudança na dinâmica familiar, onde o pai, a mãe e a irmã precisam buscar emprego, já que o filho se encontra improdutivo, sob a suspeita de até então estar doente.

A partir dessa perspectiva, é possível analisar a obra através da teoria Marxista. Segundo Karl Marx (apud Ramos, 2022), a essência do capitalismo está na busca incessante pelo lucro por parte da burguesia – dona dos meios de produção, como indústrias, máquinas e terras -, o que ocorre por meio da exploração da força de trabalho do proletariado. Devido a esse grupo não possuir bens produtivos próprios, eles passam a depender do salário para sobreviver. Marx também afirma que a remuneração oferecida pelo burguês ao trabalhador é desproporcional à sua produção, e que o bem-estar desse grupo é desprezado durante o processo (RAMOS, 2022).

Nessa perspectiva, em A Metamorfose, durante toda narrativa a renda está sempre na raiz dos problemas da família e é possível notar diversas críticas sociais sobre como o sistema capitalista impacta a identidade dos indivíduos e as suas relações sociais. Gregor é uma metáfora de alguém excluído desse sistema baseado no dinheiro, a ponto que ele pode ser comparado a pessoas em situação de rua e desempregados. A visita do chefe parece não ter ocorrido apenas para alertá-lo – ele também reclama sobre o baixo rendimento de Gregor pela firma – como também orientar a família sobre como deveria tratá-lo, caso não voltasse ao trabalho, ou seja, enfatizando a necessidade de ser produtivo para a empresa e a família.

Nessa lógica, o texto retrata perfeitamente, junto com um toque de ficção, as consequências do sistema de produção capitalista. Sistema vigente esse que menospreza o trabalhador por um salário que não é proporcional a sua dedicação e exigências trabalhistas, baseadas em uma alta produtividade. Há uma frase de Marx, no Manifesto do Partido Comunista, que sintetiza bem a leitura: “A burguesia rasgou o véu de emoção e de sentimentalidade das relações familiares e reduziu-as à mera relação monetária” (Marx, 1848, p. 4).

REFERÊNCIAS:

ENGELS, Friedrich, Marx, Karl. Manifesto do Partido Comunista. Disponível em: https://www.portalabel.org.br/images/pdfs/manifesto-comunista.pdf. Acesso em: 12 de fev. de 2025.

KAFKA, Franz. A Metamorfose. 1 edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

RAMOS, Danielly. TEORIAS DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS. In: Introdução às Relações Internacionais. São Paulo: Contexto, 2022. cap. 3, p. 63-94.