
Gabriele Nascimento (acadêmica do 3º semestre de RI da UNAMA)
Keity Oliveira (Internacionalista formada pela UNAMA)
Lara Lima (acadêmica do 8º semestre de RI da UNAMA)
O gerenciamento do lixo urbano na região amazônica é um desafio complexo para a sustentabilidade da região. Este desafio é intensificado pelo crescimento populacional, aliado à expansão urbana desordenada e a infraestrutura deficiente. Esses fatores dificultam a implementação de sistemas eficazes de coleta, tratamento e destinação adequada dos resíduos sólidos, comprometendo a qualidade ambiental.
Além disso, a sazonalidade climática, a vastidão territorial e a dificuldade de acesso a diversas localidades intensificam os desafios na gestão dos resíduos (Unesp, 2019). A precariedade dos serviços de coleta e reciclagem agrava a contaminação de rios e solos, acelerando a degradação da biodiversidade e trazendo impactos diretos à saúde humana.
A região amazônica é berço da maior riqueza em biodiversidade do planeta. No entanto, as cidades da floresta carecem de políticas públicas que garantam efetivamente a gestão adequada de resíduos sólidos. Diante disso, consequentemente, se gera cada vez mais impactos para a população local.
Esse cenário se aplica a Belém, capital paraense, que sediará a edição 30 da Conferência das Partes (COP) da ONU (Organização das Nações Unidas) para mudanças climáticas, que ocorrerá em novembro de 2025. Segundo informações divulgadas pelo site Amazônia Vox (2024), dados da prefeitura de Belém indicam que a cidade gera aproximadamente 1,5 mil toneladas de lixo diariamente.
O acúmulo de resíduos sólidos nas áreas urbanas e periféricas da cidade é um problema significativo, agravado pela precariedade na coleta de lixo. Os trabalhadores responsáveis por essa função frequentemente enfrentam desrespeito e atrasos nos pagamentos, chegando a passar meses sem receber seus salários.
Ademais, com falta de amparo em relação a coletas de resíduos sólidos, os moradores tentam encontrar novas alternativas para resolver o acúmulo de resíduos, então, queimam e descartam lixos em terrenos abandonados, dessa forma, criando pequenos lixões por toda a cidade de forma irregular.
Essa situação resulta em mau cheiro proveniente dos resíduos acumulados e queimados e torna o ambiente propicio para o aumento de pragas urbanas como: moscas, baratas, ratos e mosquitos, o que facilita a proliferação de doenças, como dengue e leptospirose. Além disso, o lixo entope bueiros, prejudicando o escoamento adequado da água da chuva e causando alagamentos em diversas áreas.
Diante dessa perspectiva, Alexandre Carvalho (ARAÚJO, AMAZÔNIA LATITUDE, 2024), embaixador do Instituto Lixo Zero no Pará expõe: “[…] essa questão nunca se mostrou prioridade para nenhum gestor público que insiste em não adequar a cidade na Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal 12.305/2010) […]”.
Em 2010, o governo brasileiro sancionou a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que estabelece como prioridades a redução da quantidade de resíduos gerados, a eliminação dos lixões, a ampliação da reciclagem por meio da coleta seletiva e a implantação de aterros sanitários para o descarte dos rejeitos, ou seja, aqueles materiais que não podem ser reciclados ou reutilizados.
Em contraponto, empasses para uma de coleta de lixo adequada se alastram pela região metropolitana de Belém, a exemplo o município de Ananindeua. A população de Ananindeua sofre com a irregularidade e até mesmo a ausência de coleta de lixo em vários bairros do município.
Conforme dados do portal municipal de transparência analisados por Geovane Santos (2024) até outubro de 2024, a prefeitura de Ananindeua possuía uma dívida de aproximadamente 24,5 milhões com empresas privadas responsáveis pelo de recolhimento de lixo no município. Desse modo, inviabilizando a coleta e consequentemente, trazendo significativos impactos para a população local.
O professor e ativista Thiago Bessa em entrevista à agência de notícias e comunicação ALMA PRETA (2024) afirma:
“[…] Em geral, as empresas contrariam a própria lei deixando de fazer a coleta, enquanto a dívida se acumula integralmente, apesar do serviço não prestado, geram assim um círculo vicioso onde as pessoas não têm acesso ao serviço público de qualidade, isto porque na forma privatizada como vem sendo prestado, onde só se prioriza o lucro, o bem-estar da população fica em segundo plano.”
A crise sanitária atinge também comunidades quilombolas. Liderança do quilombo Abacatal denuncia que a comunidade com cerca de 172 famílias nunca teve acesso a coleta de lixo. Segundo Vanuza do Abacatal:
“No Abacatal nunca teve um projeto, uma proposta, nem de vereadores, nem do prefeito, que fosse resolver essa situação da coleta seletiva de lixo. Pelo contrário, é depositado na estrada, no ramal da comunidade, vários descartes de bota fora: resto de árvore, resto de construção e até mesmo outros lixos domésticos são jogados na estrada da comunidade.” (ALMA PRETA, 2024).
O aterro sanitário de Marituba começou suas atividades em 2015 para servir de alternativa mais sustentável em relação ao lixão do Aurá, localizado em Ananindeua. Segundo Marcos Passos e Valéria Martins (2023), o aterro de Marituba recebe aproximadamente 480 mil toneladas de resíduos por ano, sendo que Belém corresponde a quase 75% dos resíduos, Ananindeua com cerca de 20% e Marituba com aproximadamente 5%.
Sendo o único aterro sanitário da região licenciado pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMAS), o Aterro de Marituba, apesar de não ser um lixão, enfrenta descaso pelo os municípios que o utilizam, pois o lixo ali jogando não passa pelos os devidos tratamentos que foram instituídos em sua criação.
Dessa forma, causando descontentamento na população que sofre diretamente as consequências e alegam odor forte e problema respiratórios.
Além de reduzir a vida útil do aterro, conforme indicado no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), a previsão inicial para a operação do aterro era de 15 anos e 5 meses (Passos e Martins, 2023). Entretanto, segundo Gabriel Pires (OLIBERAL, 2025), o prazo atual de funcionamento foi prorrogado até 28 de fevereiro de 2025. Nesse contexto, a região metropolitana deverá definir um novo local para o descarte de lixo, o qual, até o momento, ainda não foi definido.
Em abril de 2024, a prefeitura de Belém anunciou a contratação da empresa Ciclus Amazônia, formada a partir de um consórcio da iniciativa privada. A empresa já está atuando na limpeza da cidade e tem prevista na licitação a implementação de um novo aterro, porém, não houve divulgação de etapas ou prazos definidos.
Após um mês do início da operação da empresa, em maio de 2024, a Prefeitura de Belém divulgou em notícia no site oficial que aguarda a análise e liberação da licença ambiental pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas) para o início da construção do novo aterro sanitário, conforme Nardin (2024).
Com a troca de gestão da Prefeitura de Belém, restam poucos dias para o fechamento do aterro sanitário de Marituba, definido para o dia 28 de fevereiro e a região Metropolitana de Belém ainda não possui um novo local para a destinação dos resíduos sólidos provenientes da capital, de Ananindeua e Marituba. Conforme Pires (2025), a Guamá Tratamento de Resíduos, empresa responsável pelo local, assegura que as atividades seguem regularmente até o prazo estabelecido.
Segundo Breno Imbiriba, professor e pesquisador da UFPA, a questão do gerenciamento de lixo urbano na região é complexa, cara e complicada (Nardin, 2024), uma vez que mexe com política pública de alto nível com a necessidade de uma atuação em conjunto a nível estadual que desde os últimos anos, vem se mostrando cada vez mais deficitária e insuficiente.
Para além das esferas políticas, Imbiriba também reforça a importância de uma mudança estrutural na sociedade do consumo com medidas combinadas, paralelas, como incineração e compostagem em conjunto com uma coleta seletiva bem feita, uma separação e redução de volume lá na ponta, onde o resíduo é gerado.
Dessa forma, a gestão eficaz do lixo urbano na região exige uma abordagem multifacetada, através da parceria entre as gestões políticas e a própria população local em uma logística que necessita de alterações sistêmicas na produção e no consumo, além da atuação do Estado, através de políticas públicas comprometidas com o bem-estar social, logo é de fundamental importância o comprometimento de todos os agentes da sociedade para a resolução da problemática e indicadores positivos econômicos, ambientais e sociais.
Diante do exposto, recomenda-se a leitura do livro “Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos na Amazônia Brasileira” (2016), uma adaptação da tese do doutorado do professor e pesquisador paraense Paulo Pinho, apresentada no PROCAM/USP. A obra apresenta a sistematização da avaliação de todos os Planos, elaborados até 2010, de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos Urbanos (PGIRSUs) e implantados na Amazônia. Ao longo de anos, o pesquisador se debruçou sobre o desafio da gestão dos resíduos sólidos nas cidades da Amazônia e buscou caminhos estratégicos para propor soluções à crise do lixo na região. O livro pode ser adquirido na Amazon, através do link a seguir:
< https://www.amazon.com.br/Res%C3%ADduos-S%C3%B3lidos-Urbanos-Amaz%C3%B4nia-Brasileira/dp/8541610470 >
Também se recomenda o vídeo criado pela Amazônia Vox que integra uma série de reportagens que foram viabilizadas pela bolsa colaborAcción de investigação jornalística 2024, concedida pela Fundação Gabo e Fundação Avina. Na linha, a reportagem destaca quatro iniciativas de mulheres que estão conseguindo mostrar soluções com evidências de que é possível reduzir e reutilizar resíduos, com geração de renda e economia em suas atividades. O vídeo está disponível para ser assistido no Youtube, através do link a seguir:
< https://www.youtube.com/watch?v=KMIGn_pIKic&ab_channel=Amaz%C3%B4niaVox >
Por fim, indica-se o Observatório do Clima, fundado em 2002 e que representa uma rede de organizações da sociedade civil, tendo como principal objetivo discutir as mudanças climáticas no contexto brasileiro, que incluem representatividade, pluralidade e longevidade na discussão de mudanças climáticas. A plataforma também apresenta dados atualizados sobre estimativa de emissões de gases poluentes por países que estão diretamente ligados com os resíduos que são descartados. Para mais informações, acesse:
Site: < https://www.oc.eco.br/ >
Instagram: < https://www.instagram.com/observatoriodoclima/ >
Facebook: < https://www.facebook.com/ObservatorioClima >
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, de Raisa. Crise do lixo em Belém: uma poderosa moeda política em 2024. AMAZÔNIA LATITUDE, 2024. Disponível em: < https://www.amazonialatitude.com/2024/04/23/crise-lixo-belem-moeda-politica/> Acesso em: 14 fevereiro de 2025.
NARDIN, Daniel. Iniciativas em Belém mostram como a cidade da COP 30 pode reduzir geração de resíduos – Episódio 1. AMAZÔNIA VOX, 2024. Disponível em: < https://amazoniavox.com/reportagens/view/99/iniciativas_em_belem_mostram_como_a_cida de_da_cop_30_pode_reduzir_geracao_de_residuos_episodio_1#:~:text=O%20lixo%20produ zido%20na%20capital,menos%20recicla%20seus%20res%C3%ADduos%20s%C3%B3lidos > Acesso em: 14 de fevereiro de 2025.
Martins, Valéria; PASSOS, Marcos. Lixo na Grande Belém: entenda história e denúncias envolvendo o aterro sanitário de Marituba. G1, 2023. Disponível em: < https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2023/07/31/lixo-na-grande-belem-entenda-historia-edenuncias-envolvendo-o-aterro-sanitario-de-marituba.ghtml > Acesso em: 15 de fevereiro de 2025.
PIRES, Gabriel. Aterro de Marituba: a menos de um mês do fechamento, novo local para os resíduos ainda é indefinido. OLIBERAL, 2025. Disponível em: < https://www.oliberal.com/belem/a-menos-de-um-mes-do-fechamento-do-aterro-de-maritubabelem-segue-sem-novo-local-para-os-residuos-1.915582 > Acesso em: 15 de fevereiro de 2025.
RAMOS, Giovanne. Pará: crise na coleta de lixo em Ananindeua expõe conflito político e afeta quilombolas. ALMA PRETA, 2024. Disponível em: < https://almapreta.com.br/sessao/cotidiano/para-crise-na-coleta-de-lixo-em-ananindeua-expoeconflito-politico-e-afeta-quilombolas/> Acesso em: 14 de fevereiro de 2025.
T4H Ambiental. Os desafios da gestão de resíduos sólidos urbanos na Amazônia. 2023. Disponível em: < https://ambiental.t4h.com.br/noticias/os-desafios-da-gestao-de-residuos-solidos-urbanos-na-amazonia/> Acesso em: 16 fev. 2025.
