
José Scerni – acadêmico do 6º semestre de Relações Internacionais da Unama
Desde que reassumiu o cargo de presidente dos Estados Unidos, Donald Trump vem demonstrando uma postura incisiva em relação às suas políticas externas e internas, causando reações diversas tanto da população de seu país quanto de outros atores no sistema internacional.
No prisma geopolítico, as estratégias protecionistas e agressivas de Trump representam uma reação particular aos novos pólos de poder internacionais que desafiam a hegemonia dos Estados Unidos, destacando-se China e Rússia nesse papel, o que levanta o questionamento se esse posto pode estar em crise.
Para responder essa pergunta, dentro do ponto de vista teórico das Relações Internacionais, o realismo ofensivo do professor estadunidense John Mearsheimer evidencia essas constantes disputas de poder e hegemonia no sistema internacional como parte iminente da sua formação estrutural, destacando uma abordagem agressiva por controle principalmente no contexto bélico e estratégico entre as potências mundiais (MEARSHEIMER. 2014).
Sob esse viés, é possível afirmar que, para alcançar hegemonia e poder, as potências mundiais como China e Rússia devem desafiar a influência dos Estados Unidos. Nesse sentido, o segundo mandato de Trump deve ser pautado, no âmbito da sua política externa, em como serão as reações a essas ameaças. (MEARSHEIMER. 2014)
Em entrevista ao programa System Update no início de 2025, Mearsheimer fez duras críticas à política externa de Trump frente a ameaça chinesa, particularmente do ponto de vista estratégico da formação e quebra de alianças, afirmando que os posicionamentos do seu segundo mandato são radicais, principalmente em relação ao primeiro.
Durante sua participação, Mearsheimer refletiu sobre as tarifas de Trump contra países do Leste Asiático: “A pergunta mais interessante, do meu ponto de vista […] é o efeito que essas tarifas têm sobre países do Leste Asiático que gostaríamos que estivessem do nosso lado contra a China”. Esse questionamento denota o ponto de vista de um posicionamento perigoso que pode eventualmente diminuir o poder de influência dos Estados Unidos e valorizar o da China, que já firma relações estáveis nessa zona estratégica. (Opera Mundi. 2025)
Em outra esfera, o grande crescimento do bloco dos BRICS representa uma nova ordem na economia e no comércio internacional, principalmente no que se diz respeito a quebra do sistema econômico que fortalece os Estados Unidos através da desdolarização, que retira a dependência do uso do dólar nas transações econômicas internacionais. À medida que os membros do BRICS deixam de depender do dólar, eles fogem do controle econômico dos Estados Unidos, evidenciando mais uma vez a formação de novos pólos de poder. (AYUB, Nicole, USP. 2024)
Esse processo indica uma nova ordem de alianças que adicionam alternativas de resposta a reações e ataques agressivos dos Estados Unidos, principalmente no âmbito econômico. Porém, para além disso, ele representa resposta ao boicote particular do governo Trump à organizações multilaterais através da sua saída de iniciativas como o acordo de Paris, (FRITZ, Angela, CNN Brasil. 2025) já que o BRICS se posiciona como um organismo de valorização da abordagem multilateral. (DINIZ, Daniel, BRICS Brasil. 2025)
Um acontecimento que expõe essa nova dinâmica no sistema internacional ocorreu em julho de 2025, quando Donald Trump anunciou a imposição de tarifas contra vários países sendo de 50% para importações brasileiras sob a justificativa de uma relação comercial desbalanceada e na tentativa de reverter as acusações judiciais contra o ex-presidente Jair Bolsonaro feitas pelo Supremo Tribunal Federal. (NAKAMURA, João, CNN Brasil. 2025) Como medida de contenção, o governo brasileiro busca fortalecer seus laços com outras economias em busca de diversificar o mercado para suprir as exportações aos Estados Unidos. (CALZOLARI, Isabella, G1. 2025)
Esses episódios corroboram para a visão teórica de Mearsheimer, já que demonstram um esforço considerável de países no sistema internacional para quebrar a hegemonia estadunidense em busca de crescimento e apresentam uma nova formação estrutural do sistema internacional. (MEARSHEIMER. 2014)
Em conclusão, embora ainda seja cedo para determinar uma crise hegemônica dos Estados Unidos, o governo Trump enfrenta grandes desafios em um cenário único desde o fim da Guerra Fria, onde o seu controle e poder de influência nunca estiveram tão ameaçados. Nesse sentido, à medida que as suas reações agressivas encontram barreiras no sistema internacional, os Estados Unidos se aproximam de um novo parâmetro geopolítico.
Referências:
AYUB, Nicole. Sistema de pagamentos internacionais dos BRICS, moeda comum e desdolarização. USP. Disponível em: https://sites.usp.br/gebrics/sistemas-de-pagamentos-internacionais-dos-brics-moeda-comum-e-desdolarizacao/. Acesso em: 13 ago 2025.
CALZOLARI, Isabella. Governo anuncia nesta quarta pacote para socorrer empresas exportadoras afetadas pelo tarifaço. G1, Brasília, 13 ago 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/08/13/governo-anuncia-nesta-quarta-pacote-para-socorrer-empresas-exportadoras-afetadas-pelo-tarifaco.ghtml. Acesso em: 13 ago 2025.
DINIZ, Daniel. A Crise do Multilateralismo: O Poder de Mudança nas mãos do BRICS. BRICS Brasil, 2025. Disponível em: https://brics.br/pt-br/noticias/artigos/a-crise-do-multilateralismo-o-poder-de-mudanca-nas-maos-do-brics. Acesso em: 13 ago 2025.
FRITZ, Angela. O que é o Acordo de Paris e por que os EUA saíram. CNN Brasil, 21 jan 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/o-que-e-o-acordo-de-paris-e-porque-os-eua-sairam/. Acesso em: 13 ago 2025.
MEARSHEIMER, John. Can China Rise Peacefully. The National Interest, 2025. Disponível em: https://nationalinterest.org/feature/can-china-rise-peacefully-10204. Acesso em: 13 ago 2025 NAKAMURA, João. Trump anuncia tarifa de 50% para Brasil. CNN Brasil, São Paulo, 9 jul 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/trump-anuncia-tarifa-de-50-para-brasil/. Acesso em: 13 ago 2025.
