
Keity Oliveira, Pedro Henrique de Aviz e Stefany Campolungo, internacionalistas formados pela UNAMA.
Ficha Técnica:
Ano: 2025
Direção: James Gunn
Gênero: Super-herói, Ação, Ficção Científica, Fantasia e Aventura
Distribuição: Warner Bros. Pictures
País de Origem: Estados Unidos
Neste ano de 2025, um dos mais famosos super heróis da história ganhou mais uma adaptação para os cinemas. “Superman” (2025) conta a história de Clark Kent, um jornalista que vive em Metrópolis e que tenta conciliar sua rotina pessoal e profissional com a vida de super herói. A obra foi um grande sucesso e marca um recomeço para o universo cinematográfico da DC Comics e para o super herói com o característico “S” no peito (Da Silva, 2025).
O filme Superman (2025) dirigido e roteirizado por James Gunn, marca o reinício oficial do Universo Cinematográfico da DC, inaugurando o chamado “Capítulo 1: Deuses e Monstros”. A trama apresenta Clark Kent (David Corenswet) já em seus primeiros passos como repórter no Planeta Diário e como herói de Metrópolis, explorando o equilíbrio entre sua herança kryptoniana e sua vida mundana.
De um lado, Clark lida com os desafios cotidianos junto de Lois Lane (Rachel Brosnahan), sua companheira e colega de trabalho; do outro, enfrenta as manipulações de Lex Luthor (Nicholas Hoult), antagonista que representa o cinismo e a desconfiança em relação a figuras de poder. Luthor não é apenas uma ameaça política e intelectual, mas também um contraponto ideológico ao ideal de esperança defendido por Superman.
O novo filme veio com a proposta de trazer para a narrativa um Superman mais humanizado e com um símbolo de esperança mais abrangente no atual contexto internacional. Durante o filme, é mostrado como a sociedade contemporânea deixou de valorizar a bondade e a honestidade, e, por conta disso, Superman sofre diversas críticas acerca de suas ações heróicas ao decorrer do longa (IMDb, 2025).
O filme se aprofunda na ideia de que a bondade é revolucionária em um mundo marcado pela violência. Ao longo da narrativa, Superman precisa aprender a equilibrar sua força ilimitada com a responsabilidade de usá-la de maneira justa e compassiva, mesmo quando seria mais fácil ceder ao medo ou à raiva.
Um dos pontos criticados pela sociedade é a interferência do herói em guerras, em áreas subdesenvolvidas, e em outros assuntos internacionais, mesmo quando ele salva vidas, pois isto é visto como uma transgressão e ameaça a soberania de outros Estados. Além disso, quando a população descobre que o herói é um ser extraterrestre, ele é visto como uma ameaça e tem suas atividades limitadas e seus direitos tomados pela comunidade internacional, mesmo com toda sua ajuda na manutenção da paz e da ordem.
O pensamento pós-colonial nas Relações Internacionais pode ser compreendido como um conjunto de teorias das Ciências Humanas e Sociais que possuem como objeto de estudo as relações de poder entre o colonizador e o colonizado (Toledo, 2021). Inspirado por autores como Edward Said, Franz Fanon, Aníbal Quijano e Gayatri Spivak, essa abordagem faz uma crítica às heranças do colonialismo que ainda persistem nas formas de dominação simbólica, cultural e institucional. Ao invés de aceitar as categorias tradicionais de análise (como Estados, poder e segurança) como neutras, a perspectiva pós-colonial investiga como essas categorias são construídas a partir de discursos eurocêntricos que marginalizam o “Outro” — seja ele ex-colonizado, o imigrante, o estrangeiro ou qualquer identidade que fuja da norma ocidental dominante.
Um dos principais nomes da teoria pós-colonial, Edward Said (1935-2003) foi responsável por inaugurar uma crítica contundente às formas pelas quais o Ocidente constrói a imagem do “Outro” para justificar a dominação. Em sua obra fundamental, “Orientalismo” (1978), Said argumenta que o “Oriente” não é uma realidade geográfica ou cultural autônoma, mas uma invenção do Ocidente, moldada por discursos literários, acadêmicos e políticos que o representam como irracional, exótico, atrasado e ameaçador. Essa construção discursiva, conforme o autor (1990), teve como função sustentar o colonialismo europeu, legitimando a ideia de que os povos orientais — e, por extensão, os não ocidentais — precisavam da tutela do Ocidente para alcançar a civilização e a racionalidade.
Em outra perspectiva, Gayatri Spivak, em seu ensaio mais influente, “Can the Subaltern Speak?” (1988), questiona se os sujeitos subalternos, os quais se encontram à margem das estruturas de poder, realmente conseguem expressar suas vozes em um sistema que tende a silenciá-los ou representá-los de maneira distorcida. Para a autora (2010), mesmo quando o subalterno aparentemente fala, sua voz é mediada por instituições, discursos e práticas que filtram, editam ou mesmo anulam seu sentido original. A voz do subalterno, portanto, não é apenas ignorada, mas muitas vezes apropriada e traduzida pelos detentores do poder, sobretudo por intelectuais ocidentais que, ainda que bem-intencionados, falam em nome do outro sem permitir que este se manifeste de forma independente.
O pensamento de Said fica evidente no longa quando o país fictício Borávia tenta a todo modo invadir Jarhanpur, sob a perspectiva de “libertar” o povo de um governo ditatorial. Não obstante, a invasão da Borávia não é apenas feita pelo Presidente Vasil Ghurkos (Zlatko Burić), mas um conflito criado e financiado por Lex Luthor com a única finalidade de anexar parte do território de Jarhanpur e também incriminar Superman quando o herói salvou o povo de Jarhanpur de serem assassinados pela Borávia, fazendo uma clara alusão ao genocídio feito por Israel na Palestina.
A ideia geopolítica dita no filme por Vasil Ghurkos de que Superman, por ser um herói de Metrópolis, estaria fazendo as necessidades e vontades do Governo dos Estados Unidos, expressa o pensamento de Said de os povos não ocidentais precisam da tutela do Ocidente para alcançar a civilização, mesmo que Superman não fosse uma entidade governamental, e sim estivesse expressando suas próprias vontades e desejos de impedir o povo de Jarhanpur de ser aniquilado.
Ao mesmo tempo, a perspectiva de Gayatri Spivak complementa a análise, chamando atenção para os subalternos de Jarhanpur, que aparecem como vítimas sem agência ou voz própria. Percebe-se então, a história do povo de Jarhanpur são contadas e manipuladas por forças externas, como o Presidente Ghurkos e o magnata Lex Luthor, não tendo espaço para expressar sua voz sobre como o genocídio realmente acontece em suas terras.
Com isso, Superman (2025) trás uma nova perspectivas para os futuros filmes de heróis, mostrando como instituições, empresas e governos podem ser tão corruptos e violentos quanto inimigos vindo do espaço. A narrativa moderna de Superman mostra como ser herói vai além de ter superpoderes e mostra que a bondade, a gentileza e o altruísmo são os diferenciais em nossa sociedade.
REFERÊNCIAS
DAEHN, Ricardo. “Superman” estreia com multiverso, guerra e crítica à desinformação. Correio Braziliense, Brasília, 10 jul. 2025. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/diversao-e-arte/2025/07/7195338-ecos-de-resistencia-criado-ha-quase-90-anos-superman-agrada-na-telona.html. Acesso em: 10 set. 2025.
DA SILVA, Gustavo Simas. Esperança e psicopolítica em Superman (2025): uma análise à luz das categorias de Byung-Chul Han. Lumen ET Virtus. Universidade Federal de Santa Catarina. Santa Catarina, 2025.
IMDb. Superman (2025). IMDb. 2025. Disponível em: https://www.imdb.com/pt/title/tt5950044/. Acesso em 09 de setembro de 2025.
SAID, E. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
SPIVAK, Gayatri C. Pode o subalterno falar? 1. ed. Tradução: Sandra R. Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2010.
TOLEDO, Aureo (Ed.). Perspectivas pós-coloniais e decoloniais em relações internacionais. SciELO-EDUFBA, 2021.
