Sthephanye dos Santos Caldeira – acadêmica do 6°semestre de Relações Internacionais (UNAMA)

As visíveis mudanças climáticas deixaram de ser uma preocupação futura, mas uma realidade incontestável do presente. A crise deixou de ser apenas um risco incerto e distante, transformou-se em um problema cujos efeitos são evidentes e sentidos em escala global. Em julho do ano de 2023, o atual secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, declarou no seu impactante discurso que “a era do aquecimento global acabou e a era da ebulição global chegou” (ONU NEWS, 2023).

De uma maneira metafórica, ele descreve a seriedade desse momento histórico e a necessidade de respostas políticas urgentes frente a gravidade e a irreversibilidade dos danos ao meio ambiente. Nesse cenário, a concretização da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), que será realizada pela primeira vez em Belém do Pará, simboliza um enorme marco para os debates climáticos, será um alicerce do futuro, destacando o Brasil liderando as negociações climáticas e a Amazônia no centro dos debates e do mundo (BRASIL, MMA, s.d.)

De acordo com o mais recente relatório da ONU, o aumento médio da temperatura global em relação aos níveis chamados pré-industriais ultrapassou 1,6ºC, aproximando-se de forma alarmante do limite de 1,5ºC definido pelo Acordo de Paris (G1, 2025). Essa elevação já tem consequências imediatas notórias, como o aumento dos fenómenos climáticos extremos em diferentes regiões do mundo, enchentes, secas severas e a intensificação da crise humanitária de refugiados climáticos.

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, Marina Silva declarou recentemente que “Nós vivemos um momento de muitas contradições, e o importante é que estamos dispostos a superar essas contradições”. Isso significa que, embora todos os países precisem se mobilizar contra as alterações climáticas, o grau desse esforço varia conforme a realidade e os recursos de cada nação. Tais afirmações refletem que ainda há divergências quanto às questões petrolíferas, transição energética e o conceito de desenvolvimento sustentável, mas uma concordância na ideia de que todos compartilham responsabilidades, ainda que de maneira distinta, principalmente daqueles mais suscetíveis aos impactos nocivos do aquecimento global (AGÊNCIA BRASIL, 2025).

Embora a situação atual seja gravemente alarmante, os debates climáticos não são tão das gerações atuais. Desde o Protocolo de Kyoto (1997), depois substituído pelo famoso Acordo de Paris (2015), refletem como a ONU e grande parte da comunidade internacional têm buscado mecanismos de combate e de adaptação para lidar ou até postergar à crise climática. Desse modo, as Conferências das Partes (COPs) assumem papel fundamental, ao criar esses espaços multilaterais para definição de metas, pactos e compromissos de redução das emissões de gases que intensificam o efeito estufa. Entretanto, existe um abismo entre os compromissos assumidos e a concreta implementação que ainda revela os desafios políticos, econômicos e sociais dessa governança climática (BRASIL, MMA, s.d).

A perspectiva pós-colonial, nos ajuda a entender que a influência do poder exploratório não cessou com o fim do colonialismo formal. Ela persiste nas estruturas de domínio, no saber e na forma como interagimos com o meio ambiente. A noção de “colonialidade do poder”, apresentada por autores como Quijano (1992), argumenta que as hierarquias raciais, econômicas e de conhecimento criadas ao longo da história ainda moldam o mundo em que vivemos.

Se as negociações forem orientadas por discursos centrados na lógica de compensações e na mercantilização dos ecossistemas, e na privatização do crédito de carbono, conforme os críticos denominam “colonialismo de carbono”, acontece o perigo de deixar os grandes monopólios e empresas nortearem as políticas ambientais ao seu favor e validar uma nova modalidade de colonialismo verde. Assim, defender uma COP 30 diversificada, abrangente e crítica também representa um esforço para descolonizar as narrativas climáticas (DA SILVA; VIEIRA, 2024).

Em seu livro “Ideias para adiar o fim do mundo” (2019), Ailton Krenak defende que devemos reconsiderar nossa conexão com a natureza, que ela é subjetiva, entendendo-a não apenas como um recurso a ser explorado, mas como parte intrínseca da sociedade e da vida humana, de modo sensível ele constrói o pensamento de que “A natureza não é um recurso à disposição do homem, mas um parceiro sem o qual a vida humana não é possível.” (KRENAK, 2019). Essa visão se alinha à teoria pós-colonial das Relações Internacionais, que questiona a perspectiva eurocêntrica do desenvolvimento e defende a valorização de conhecimentos locais e tradicionais.

Em um âmbito ambiental, o pensamento de Krenak destaca que vencer a crise climática requer a ruptura com a lógica extrativista e capitalista predatória que transforma a natureza em mais uma mercadoria. Além de objetivos globais, é essencial considerar as vozes e vivências dos povos originários e amazônicos, que têm preservado ecossistemas vitais para o planeta ao longo da história. Nesse contexto, reforçam a urgência da colaboração entre países, empresas, sociedade civil e comunidades tradicionais (ORTEGA, 2025).

Em síntese, há grandes desafios sobre a governança climática e suas ramificações. É notável que ainda há uma imensa lentidão nas implementações de políticas públicas ambientais e uma colossal resistência das esferas econômicas, que são as mais potencialmente poluidoras, de modo que atrasam os avanços efetivos.

Todavia, a COP 30 representa uma oportunidade singular com a Amazônia como anfitriã da conferência, tomando seu papel de protagonista, e movimentando com si os povos e comunidades que são os que mais sofrem com os efeitos da iminente crise ambiental. Embora haja inúmeros obstáculos, as perspectivas são promissoras, mas existem urgência na tomada de decisões, pois o tempo de ação já se esgotou. A ebulição global pode não ser mais reversível.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Rumo à COP30. Disponível em: https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/mudanca-do-clima/rumo-a-cop-30. Acesso em: 30 set. 2025.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima; Agência Brasil. “Estamos dispostos a superar contradições”, diz Marina sobre petróleo. Agência Brasil, 6 jul. 2025. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/meio-ambiente/noticia/2025-07/estamos-dispostos-superar-contradicoes-diz-marina-sobre-petroleo. Acesso em: 30 set. 2025.

DA SILVA, Hanieri Alves; VIEIRA, Ivinna Kariny da Costa. O crédito de carbono e o novo colonialismo na América Latina: paradigmas da lógica capitalista e do desenvolvimento sustentável. Meio Ambiente (Brasil), v. 6, n. 1, 2024. Disponível em: https://meioambientebrasil.com.br/index.php/MABRA/article/view/451. Acesso em: 3 out. 2025.

G1. Mundo ultrapassa a marca de 1,6ºC: entenda o que isso significa para o clima e quais os impactos para o Brasil. G1, São Paulo, 11 jan. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/meio-ambiente/noticia/2025/01/11/mundo-ultrapassa-a-marca-de-16c-entenda-o-que-isso-significa-para-o-clima-e-quais-os-impactos-para-o-brasil.ghtml. Acesso em: 30 set. 2025.

KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

ONU. O julho mais quente da história sinaliza que “a era da ebulição global chegou”, diz chefe da ONU. Notícias da ONU. Disponível em: https://share.google/JhlEyGealGKyzXUu. Acesso em: 30 set. 2025.

ORTEGA, Anna. Ailton Krenak: “A Terra pode nos deixar para trás e seguir o seu caminho”. Jornal da Universidade, Porto Alegre, 12 nov. 2020. Disponível em: UFRGS. Acesso em: 2 out. 2025.

PUCRS. Ebulição Global: impactos sociais e ambientais. Portal PUCRS, Porto Alegre, 2025. Disponível em: https://portal.pucrs.br/noticias/impacto-social/ebulicao-global. Acesso em: 30 set. 2025.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. Revista Latinoamericana de Sociología, n. 5, p. 1‑42, 1992.