Rodrigo Lobato (acadêmico do 6° semestre de R.I da UNAMA)
Gabriele Nascimento (acadêmica do 4º semestre de RI da UNAMA)

O turismo na Amazônia tem se consolidado como uma das principais atividades econômicas emergentes da região, impulsionado pelo interesse crescente em paisagens naturais, culturas tradicionais e experiências consideradas autênticas. Contudo, esse avanço nem sempre ocorre de forma planejada ou sustentável.


Na Ilha do Combu, localizada às margens de Belém (PA) e reconhecida por sua relevância sociocultural e ambiental, observa-se a intensificação de práticas associadas ao turismo predatório. Esse fenômeno, marcado pela exploração desordenada dos recursos naturais, pressão sobre a infraestrutura local e descaracterização das práticas tradicionais, tem gerado impactos significativos sobre as comunidades que historicamente habitam e manejam o território.


Nesse contexto, compreender como o turismo predatório se manifesta na Ilha do Combu e quais são seus efeitos sobre as populações tradicionais torna-se essencial para subsidiar políticas públicas, orientar estratégias de manejo sustentável e promover formas de turismo que respeitem a sociobiodiversidade amazônica.


Em primeiro plano, ao entender a importância de Belém como palco para a COP30, é crucial observar a realidade territorial da Ilha do Combu e o que ocorre dentro dos debates diplomáticos.


O passeio dos chefes de governo, Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron pela ilha em 26 de março de 2024, virou um ponto de partida para os acordos do meio ambiente e jogou a área no holofote mundial. Ainda assim, é possível observar como ainda existe uma dissonância entre a agenda de “turismo regenerativo” proposta pelo governo federal e a prática de um turismo predatório que cresce sobre as comunidades tradicionais.


É importante analisar que a visibilidade trazida por eventos como a COP30 e visitas de chefes de Estado tem prós e contras. Conforme reportado, a ilha que serviu de cenário para acordos bilaterais enfrenta agora os impactos diretos da “jet-skização” e do fluxo desordenado de visitantes.


O grande aumento do tráfego de embarcações motorizadas e jet-skis nos furos e igarapés causam poluição sonora, perturbação da fauna e consequentemente gerando o fenômeno do “banzeiro” em que ondas provocam a erosão das margens e destroem a infraestrutura de atracação dos ribeirinhos (Queiroz, 2024). Esse cenário evidencia como a degradação ambiental representa uma falha na governança local em antecipar e minimizar os efeitos colaterais da exposição recente.


De acordo com dados recentes sobre a ilha (Sepêda, 2025), o local está deixando de ser um território de vivência ancestral para se tornar uma zona de consumo rápido e lazer. Reportagens evidenciam como a especulação imobiliária e a construção irregular de estabelecimentos comerciais promovem o aterramento de áreas de várzea e a supressão da vegetação nativa.


Assim, o impacto desse modelo de exploração afeta diretamente a vida da população local, principalmente as mulheres que vivem nas margens do rio. A matéria-prima usada para fazer os artesanatos é parte importante da economia florestal e cada vez mais está desaparecendo em decorrência das alterações que a ilha está sofrendo, e tende a piorar com a ação humana predatória na ilha, conforme noticiado por Araujo (2025).


A escassez desses recursos naturais obriga as artesãs a buscarem materiais cada vez mais distantes ou a abandonarem seus ofícios tradicionais, criando uma dependência econômica dos subempregos gerados pelos novos empreendimentos turísticos.


Além disso, a gestão de resíduos sólidos representa outro problema estrutural que expõe a incapacidade do sistema diante da demanda turística. O volume de dejetos gerados pelo alto fluxo de visitantes ultrapassa a capacidade logística de coleta e tratamento da região, resultando na contaminação da água para as comunidades locais.


Planos de mitigação contra o turismo predatório, anunciados após a repercussão dos impactos após a visita presidencial, tentam minimizar esses danos (Queiroz, 2024), mas esbarram na complexidade logística e na ausência de fiscalização contínua na região da Ilha do Combu.


Outrossim, é necessário analisar como o turismo predatório no Combu é um reflexo de uma crise mais ampla, e que afeta diversos destinos brasileiros (BrasilTuris, 2023), mas que ganha contornos geopolíticos em Belém devido à Conferência das Partes que foi realizada neste ano. Enquanto a comunidade internacional projeta na Amazônia a imagem de um “santuário climático”, a realidade na gestão do território periurbano de Belém expõe as fraturas desse discurso.


O que fica claro acerca do desenvolvimento, é o quanto a assim chamada “sustentabilidade” reproduz práticas coloniais usadas para fins exploratórios e que quebram a ideia de progresso sustentável. O território é explorado e consumido como se fosse uma mercadoria exótica, mas, ainda assim, a população que o habita permanece à margem dos benefícios e das decisões.


Nesse cenário, a questão da segurança e do ordenamento hídrico tornou-se insustentável. A falta de um zoneamento rígido permite que o lazer de elite, excesso de lanchas e festas, atrapalhem o modo de vida ribeirinho. Não se trata apenas de incômodo sonoro; a movimentação frenética nas águas afugenta os peixes e desorganiza a pesca, golpeando diretamente a segurança alimentar de famílias que dependem exclusivamente do rio para sobreviver.


Nesse sentido, a situação que ocorre na Ilha do Combu serve como um estudo de caso urgente para a diplomacia ambiental brasileira. Por isso, a COP30 terá o seu sucesso medido por diversos fatores, não apenas os acordos assinados no centro de convenções, mas pela forma que o Brasil irá proteger as comunidades locais e os efeitos colaterais do desenvolvimento acelerado.


Se este modus operandi continuar, restará ao mundo uma “Amazônia de fachada”, enquanto a floresta e quem a protege ficam à mercê da pressão econômica e do estrago no meio ambiente. A transição para uma economia verde exige que a proteção territorial e a manutenção dos modos de vida tradicionais sejam tópicos inegociáveis, e não apenas em notas de rodapé de panfletos.


Portanto, torna-se evidente a urgência de repensar os atuais modelos de exploração turística adotados na região. A pressão exercida sobre os recursos naturais, a fragilização das práticas socioculturais tradicionais e a desigual distribuição dos benefícios econômicos revelam um cenário que ameaça à integridade das comunidades locais e a sustentabilidade do território.


Diante disso, é necessário a construção de alternativas baseadas no turismo de base comunitária, no fortalecimento da gestão participativa e na implementação de políticas públicas que reconheçam e protejam os modos de vida tradicionais emerge como caminho necessário.


Somente por meio de práticas responsáveis, que integrem conservação ambiental e valorização cultural, será possível garantir que a Ilha do Combu permaneça como espaço de resistência, identidade e biodiversidade e não um destino vulnerável às dinâmicas predatórias que historicamente afetam territórios amazônicos.


Diante das análises levantadas, recomenda-se a tese de Doutorado em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Pará, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas do Programa de Pós-Graduação com o título “Por um turismo decolonial: reflexões antropológicas a partir da turistificação da Ilha do Combu/PA” da Dr. Thainá Guedelha Nunes.


Disponível em: < https://repositorio.ufpa.br/jspui/handle/2011/16262 >


Além disso, indica-se o trabalho do coletivo Ativista Pororoka. A Pororoka une ativistas, artivistas e comunicadores que compartilham a missão de mobilizar e engajar a sociedade nas lutas coletivas que fortaleçam a construção de um mundo onde povos e natureza possam coexistir em harmonia e com garantia de direitos.


Site: < https://www.pororoka.org/ >
Instagram: < https://www.instagram.com/segueapororoka/ >
Facebook: < https://www.facebook.com/segueapororoka/ >


Por fim, evidencia-se a reportagem como o título “Moradores da Ilha do Combu, no Pará, reclamam da falta de regulamentação do turismo” do Brasil de Fato. O vídeo no YouTube relata as queixas dos moradores sobre a degradação ambiental, a erosão do solo e o intenso e descontrolado tráfego de embarcações, que dificulta a pesca e a navegação local.


Disponível em: < https://youtu.be/wPLt-r3c0hQ?si=B24cR51EsV-SY8Uw >

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério do Turismo. Turismo regenerativo coloca sociobioeconomia e gastronomia como novo modelo de desenvolvimento. Gov.br Turismo, [s. l.], [20–]. Disponível em: https://www.gov.br/turismo/pt-br/assuntos/noticias/turismo-regenerativo-coloca-sociobioeconomia-e-gastronomia-como-novo-modelo-de-desenvolvimento. Acesso em: 21 nov. 2025.


BRASILTURIS. Os impactos do turismo predatório no Brasil. Brasilturis, 2 ago. 2023. Disponível em: https://brasilturis.com.br/2023/08/02/os-impactos-do-turismo-predatorio-no-brasil/. Acesso em: 21 nov. 2025.


QUEIROZ, Fabrício. ESTADÃO. Barulho, lixo e jet-ski: Ilha do Pará, que recebeu Lula e Macron, cria plano contra turismo predatório. Estadão, [s. l.], [20–]. Disponível em: https://www.estadao.com.br/sustentabilidade/barulho-lixo-jet-ski-ilha-do-para-que-recebeu-lula-e-macron-cria-plano-contra-turismo-predatorio/?srsltid=AfmBOori2x54mIeQREA_SBiv65c8ml_td_p8iSc0ST4zGgfSdgMPf9l3. Acesso em: 21 nov. 2025.


SEPÊDA, Fábia. G1 PARÁ. Do isolamento à devastação: como o turismo predatório tem transformado ilha preservada na cidade da COP-30. G1, Belém, 17 ago. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2025/08/17/do-isolamento-a-devastacao-como-o-turismo-predatorio-tem-transformado-ilha-preservada-na-cidade-da-cop-30.ghtml. Acesso em: 21 nov. 2025.


ARAUJO, Beatriz. TERRA. Matéria-prima de mulheres ribeirinhas em Belém está sumindo em meio à crise climática e turismo predatório. Terra, [s. l.], [20–]. Disponível em: https://www.terra.com.br/planeta/cop30/materia-prima-de-mulheres-ribeirinhas-em-belem-esta-sumindo-em-meio-a-crise-climatica-e-turismo-predatorio,71e0af336c86140baf33e6597a387df5s4gqrzxq.html. Acesso em: 21 nov. 2025.